Seria apropriado dizer que se gastaram rios de tinta em vão se ainda fosse hábito de quem inicia polémicas escrever no papel. Gastaram-se antes horas em frente ao ecrã do computador esbracejando, vociferando, indignando-se por coisa pouca. E, lamentavelmente, a causa até seria louvável. Um episódio esquecido da nossa História. A celebração - no seu sentido mais puro - de um facto que o esforço de muitos tem conseguido apagar dos manuais de História. Confesso que eu pertencia ao grupo dos ignorantes, talvez porque não cheguei a ler o livro de Richard Zimmler que evoca o massacre. Mas basta somar dois mais dois para perceber que uma sociedade que aceita a Inquisição e a conversão forçada de Judeus à fé Católica está apenas a um passo da barbárie. E nisso, provavelmente, não somos melhores nem piores que os demais. Nisso e no hábito de escondermos com vergonha estas manchas que podem, de algum modo, atenuar o orgulho pátrio. Cantar o hino nacional e amar o passado de um país são atitudes que não se coadunam com episódios como aquele que foi recordado ontem, em frente à igreja de São Domingos. De resto, tembém nisso nos parecemos com os outros. Os americanos esqueceram os índios dizimados; os turcos forçam o desconhecimento do massacre do povo arménio; todos os países colonizadores discretamente apagam dos seus livros qualquer referência à opressão sobre os povos escravizados ou à chacina de populações, preferindo antes evidenciar o bem que trouxeram aos selvagens que educaram. Normal. Tudo normal, até a pouca afluência no encontro de ontem no Rossio. A notícia de hoje, no Público, limita-se a um pobre desfilar de nomes presentes no evento. À referência a um kaddish entoado. A um sublinhar das escassas velas acendidas em nome dos cristãos-novos massacrados. O baixo nível de quem tentou aproveitar o acontecimento por razões políticas - e penso nos dois campos que se digladiram durantes algumas semanas pela blogosfera fora - retirou-lhe importância, relegando-o para um grau de não-acontecimento; hoje desmesuradamente inflado, amanhã tristemente esquecido.
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