Quando alguém me dizia, há uns dias atrás, que começa a deixar de fazer sentido comemorar o 25 de Abril de 1974, e que cada vez mais a memória se vai tornando um privilégio de alguns e o benefício de poucos - os anos passam, e a vida foi-se tornando cada vez mais rápida e inalcançável -, entrei na dança do desconsolo e da amargura. Eu, que não sou velho, e por isso não posso ainda sentir a vantagem de interpor alguma margem de distância entre o agora e o passado - modo rebuscado de descrever essa tão lusa coisinha, o saudosismo - entrei na dança. E a sessão de lamentos e arrependimentos durou alguns minutos, até se ter naturalmente esgotado o naipe de reclamações a debitar. O que é o 25 de Abril? Para além das óbvias chalaças, e nem sequer me refiro àquele sketch do Herman em que vemos Miguel Guilherme a mudar um calendário em que todos os dias são 25 de Abril, não passa de uma data que velozmente resvala para o esquecimento colectivo; essa zona de ninguém onde agora repousam o 5 de Outubro, ou o 1 de Novembro ou outras que já nem sequer são lembradas pelo calendário dos feriados. O que é o 25 de Abril? Uma possibilidade de ficar em casa, um feriado. Sem desencanto, por favor. É esta a ordem natural das coisas. Quem ainda celebra os "amanhãs que cantam", sejamos sinceros, são aqueles que ainda sonham com as oportunidades que outra data, o 25 de Novembro, roubou. Amanhã, no desfile da avenida, estarão de alma e coração os mesmos de sempre: o PC. Os outros vão lá para serem vistos. O BE, algum representante transviado do PS, os populares que recordam com saudade a festa (atenção, verdadeira e sem cinismos) que se fez há 32 anos. E os capitães, claro. Deste modo, os que celebram são aqueles que mais razões têm para achar que as promessas da revolução não se cumpriram. A democracia não é, porém, uma palavra que deixe muito espaço para relativismos, ao contrário do que muitos apregoam. Ou há, ou não há, e isso sente-se na pele, sente-se de coração. Para todos. Universal. Mesmo que seja uma ilusão, uma bela maneira de esquecermos que viver preso a uma série infindável de regras, deveres e obrigações e ainda assim acharmos que o voto conta, é o que mais se aproxima da ideia de felicidade. Enquanto não chegar outra revolução que tome o lugar que a última ainda ocupa nos espírito de um país que cada vez mais se esquece da alegria que hoje se evoca. Para o bem e para o mal, é este o resultado do esforço de tantos. Celebrêmo-los.
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