31/12/08

Os meus blogues de 2008

As Aranhas

e sobretudo o Estado Civil, que parece despedir-se da blogosfera. Espero que o Pedro Mexia regresse - ao contrário do que afirma o triste Pacheco Pereira, a blogosfera existe por causa de bloggers como ele.

[Sérgio Lavos]

O fim do mundo em directo (lá para 2009)

Hoje, na última página do Público, Miguel Gaspar reflecte sobre o fim do mundo; nada de importante, ele tem razão: acabou quatro vezes este ano, se não mais. Ora é a subida vertiginosa do preço do petróleo, ora é a ameaça nuclear iraniana, ora é um ou outro atentado terrorista, a crise financeira, a derrocada económica... há incontáveis razões para pôr as mãos à cabeça. O que Miguel Gaspar não faz é dar o remate apropriado ao texto: para os media, estes têm sido tempos de festividade contínua. Os jornais analisam, as televisões gritam, os blogues alarmam, até à exaustão. Os canais de notícias, de hora a hora, repetem os augúrios de catástrofe, e em resposta os mercados entram mesmo em pânico, e as economias deprimem-se, e o mundo ocidental descarrila, como num mau filme de Hollywood. 

A verdadeira notícia deste ano, conclusão alarmante de um período crescente de histerismo mediático, é que bastam os boatos dos jornalistas e as previsões dos analistas para as coisas acontecerem. O hipermediatismo actual leva a que tudo se saiba a toda a hora, e numa sociedade dominada por uma economia liberal que se funda em bens virtuais, em dinheiro potencial, basta a mais ínfima centelha de pânico para espoletar um incêndio incontrolável. 

Quando a crise financeira rebentou, as televisões começavam de manhã a especular sobre a queda das boslas, continuavam ao longo do dia noticiando a queda das bolsas (espectacular Nostradamus) e finalizavam o dia aguardando ansiosamente o dia seguinte, que ainda seria pior que o anterior; o caos a qualquer momento podia se instalar, o fim do mundo parecia estar perto. Mas, milagre, umas quantas empresas faliram, o que até parece ser um facto normal nas sociedades capitalistas, e tudo passou, até que começaram a aparecer os rumores da crise económica (verdadeiros cavaleiros do Apocalipse), precedendo a real crise económica. O ciclo regular da economia parece que foi tomado pelo medo, de forma estranhamente parecida ao que acontece com o terrorismo; cada previsão económica dos analistas dos media destila o receio sobre o que virá. Pessimistas ganham espaço nas colunas dos jornais e tempo de antena na televisão, perorando infinitamente sobre a podridão do mundo actual e suspirando sobre um tempo mítico que na realidade nunca terá existido.

Convém não fecharmos os olhos aos indícios (o misticismo apocalíptico é o maná dos nossos dias). Tudo pode terminar? Claro, eventualmente, não é isso que está em causa. Mas mais depressa terminará a imprensa tal como a conhecemos, e se indícios existem, é disso mesmo; a imparável tabloidização de todos os meios de comunicação é um sintoma do fim de uma era, a que não será, de todo, alheio, o surgimento dos blogues e do do it yourself, essência da Web 2.0. 

O mundo é que não deixará de existir se não for notícia.

[Sérgio Lavos

16/12/08

Manoel de Oliveira




Um ponto de contacto entre Jason Bourne e Manoel de Oliveira seria uma ideia não só absurda como digna de anedotário. Mas a verdade é que Doug Liman, o realizador de Identidade Bourne, e Manoel de Oliveira, em Belle Toujours, encontram o cenário ideal para as suas obras numa pequena praça de Paris, fronteira ao hotel Regina. 
Henri Husson (Michel Piccoli), o velho devasso que conduzira Séverine (Bulle Ogier) à felicidade anti-burguesa em Belle de Jour, passeia-se pela cidade impelido por um sentido do acaso que o haveria de levar à mulher do seu antigo amigo. Paris é uma cidade velha, crepuscular: a lentidão silenciosa da tempo antes da noite, os tons sombrios, as ruas vazias de trânsito, os enquadramentos clássicos procurando um ponto de fuga nas arcadas do hotel, o olhar demorando-se na estátua da mulher guerreira, pleno de significado. Ou Paris será uma cidade viva, trémula, trânsito em andamento contínuo, o barulho dos carros a passar, a velocidade dos corpos sem tempo para parar e contemplar?
Em Manoel de Oliveira e Liman, há um início de sequência em que a câmara é colocada exactamente no mesmo local: na lateral do lobby do hotel, de modo a captar a entrada de Marie ( Franka Potente), num caso, e Michel Piccoli, no outro. Mas, a diferença essencial: Oliveira mantém o plano fixo durante longo tempo, depois corta para Husson perguntando por Séverine na recepção e então regressa à câmara de entrada, para apanhar Bulle Ogier (Séverine) a fugir (?) do antigo amigo. Liman escolhe a velocidItálicoade: plano curto de Potente a entrar, um excesso de figurantes a percorrer o set, campo-contracampo com planos de 1,2, segundos, travelling que acompanha Potente a dirigir-se à recepção, elipse e corte para Bourne (Matt Damon) na rua.
Em que cineasta a impressão de realidade é mais forte? No cinema-movimento de Liman, no qual cada plano serve apenas para lançar o plano seguinte, tempo ultrapassado pelo tempo, rápida sucessão de acontecimentos que não se chegam a fixar na memória? Ou no cinema-tempo de Oliveira, no qual um plano vale por si só, contém em si várias camadas de interpretação; um cinema sem pressa de chegar a lado algum (a realidade?), um cinema no qual a dimensão temporal é mais importante que a dimensão espacial. 
Será difícil encontrar melItálicohor exemplo desta essencial diferença. Terá Manoel de Oliveira visto Identidade Bourne?

[Sérgio Lavos]

08/12/08

Ciclos


Nem todos os frutos são colhidos; sabemos que alguns irão amadurecer nos ramos, amadurecer até que o peso se torne desmedido e acabem por cair no chão, apodrecidos. Na estação dos frutos apodrecidos, a Natureza cumpre-se - eles cedem o seu lugar aos frutos que começam a crescer na árvore. O ciclo de floração terá uma oportunidade de escapar ao gesto humano; e a terra espera os frutos que apodrecem.

[Sérgio Lavos]

05/12/08

Preferia não

A dor que não é física é um sentimento estético; sofrer, sofrer a bom sofrer a vida, é uma pose que disfarça ou a perplexidade ou a incapacidade de aceitar a beleza que ultrapassa a banalidade diária, a sombra dos inevitáveis espinhos que surgirão no caminho. Saber de tudo isto e não ir a jogo é o desastre completo; a ética da impossibilidade prática.

[Sérgio Lavos]

04/12/08

Quem fica

No fim de contas, não tem interesse nenhum falar dos que não sobreviveram; a sobrevivência em geral é sobrevalorizada, mas é o particular que me interessa: um Homem que abdica não deve ser chorado pelos que resistem - e quem sabe se apenas ele poderá chorar por quem fica.

[Sérgio Lavos]

Heaven beside you



[Sérgio Lavos]