12/06/06

Os empregados de escritório

Susana diz-me que todos os empregados de escritório deveriam ler Robert Walser. O uso do condicional não corresponde exactamente ao que foi dito; o tempo utilizado foi o imperfeito, mas parece-me adequado substituí-lo pelo mais ameno condicional. Deveriam. Eu não concordo, lamento. Conheço o exemplo de Walser, sim, também de Fernando Pessoa e Kafka, ouvi falar da história de Robert Musil, sei que Phillip Larkin e Perec também se mantiveram durante muito tempo à margem de tudo. Coloca-se a questão de saber se terá sido escolha ou força das circunstâncias, mas as biografias que se teceram à volta destes homens em tudo vulgares insistem na vontade férrea de existir fora do mundo. Longe da mundanidade vaidosa do mundo. Regressando ao início, insisto com Susana num ponto simples: ser empregado de escritório, ao contrário do que parece, é quase sempre um fim em si, um beco sem saída na vida dos empregados de escritório. Susana engana-se. Walser, e Kafka, e Musil e Pessoa não eram empregados de escritório escritores. Eram escritores que decidiram limpar metade do tempo a que tiveram direito, como quem limpa uma mesa, para as coisas baixas do mundo; ocupar as horas com o quotidiano eficaz das tarefas repetitivas - a lição fundamental de Heidegger. A noite ficava guardada para a excepção, a criação que diferencia o génio da massa de empregados de escritório que nunca imaginaram sequer o que é viver fora do mundo. Escrevo sem pena, mas também sem soberba. As coisas são como são.

[SL]

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