Muito daquilo que escrevo tem muito daquilo que sou, mas a verdade é que ninguém poderá saber ao certo quem sou eu a partir daquilo que escrevo.
Reencontro em alguns textos ficcionais restos do meu passado - episódios de infância, imagens que chegaram até ao presente desligadas do contexto geral, sensações difíceis de traduzir, que no papel se transformam em metáforas, aproximações à realidade, esboços linguísticos distantes do acontecimento que descrevem. A matéria para a escrita é a realidade? Nem por isso, é a realidade distorcida pelos olhos de quem vê. Por isso, a liberdade que dou ao texto, deixando que ele use como quer os fragmentos que a minha memória lhe oferece, tem plena justificação.
O que julgo ser mais interessante, neste exercício pouco imaginativo (não crio novas imagens, reciclo as antigas) de reconstrução da memória, é o reconhecimento dos pormenores que escondo no meio do texto ficcional. Sei que aquele vermelho de que falo, o vermelho de uma sala onde eram projectados filmes, numa aldeia sem salas de cinema, provavelmente nunca existiu. Esforço-me por ter a certeza de que existiu. Não consigo. No entanto, o instinto acende esse vermelho na tela da memória. Talvez fosse a cor de algum filme que tenha visto, talvez. Talvez tenha sido alguma visita à mesma sala numa altura em que era ultilizada para outro propósito que não a de sala de cinema - discoteca, com bola de espelhos a rigor e tudo. A verdade é que o edifício onde isto se passava é apenas um espaço vazio entre casas. E ninguém, de resto, confirma a minha história. Talvez nunca tenha sido projectado qualquer filme nessa casa que imagino ter existido. Não tenho a certeza. De qualquer modo, nenhuma palavra, destas que eu acabo agora de escrever, faz juz à imagem, verdadeira ou falsa, que tenho presente. E a imagem que crio em quem lê, como é diferente desta em que acredito. A distância que se alarga entre realidades; a verdade uma ideia que se conta em histórias.
Reencontro em alguns textos ficcionais restos do meu passado - episódios de infância, imagens que chegaram até ao presente desligadas do contexto geral, sensações difíceis de traduzir, que no papel se transformam em metáforas, aproximações à realidade, esboços linguísticos distantes do acontecimento que descrevem. A matéria para a escrita é a realidade? Nem por isso, é a realidade distorcida pelos olhos de quem vê. Por isso, a liberdade que dou ao texto, deixando que ele use como quer os fragmentos que a minha memória lhe oferece, tem plena justificação.
O que julgo ser mais interessante, neste exercício pouco imaginativo (não crio novas imagens, reciclo as antigas) de reconstrução da memória, é o reconhecimento dos pormenores que escondo no meio do texto ficcional. Sei que aquele vermelho de que falo, o vermelho de uma sala onde eram projectados filmes, numa aldeia sem salas de cinema, provavelmente nunca existiu. Esforço-me por ter a certeza de que existiu. Não consigo. No entanto, o instinto acende esse vermelho na tela da memória. Talvez fosse a cor de algum filme que tenha visto, talvez. Talvez tenha sido alguma visita à mesma sala numa altura em que era ultilizada para outro propósito que não a de sala de cinema - discoteca, com bola de espelhos a rigor e tudo. A verdade é que o edifício onde isto se passava é apenas um espaço vazio entre casas. E ninguém, de resto, confirma a minha história. Talvez nunca tenha sido projectado qualquer filme nessa casa que imagino ter existido. Não tenho a certeza. De qualquer modo, nenhuma palavra, destas que eu acabo agora de escrever, faz juz à imagem, verdadeira ou falsa, que tenho presente. E a imagem que crio em quem lê, como é diferente desta em que acredito. A distância que se alarga entre realidades; a verdade uma ideia que se conta em histórias.
[Sérgio Lavos]
1 comentário:
O Sérgio é aquele que eu leio naquilo que ele escreve. Só conheço este Sérgio, o da blogosfera, não conheço o outro, aquele que tem um quotidiano semelhante ou diferente, aquele que dorme, acorda, toma duche, trabalha em não sei o quê, escreve textos, tem angústias, memórias e tudo mais. Há naquilo que fica escrito um eu para além de mim. Um eu que só tem existência se for escrito (e mais ainda se for lido), ainda que o outro eu participe e determine inteiramente aquilo que se escreve.
O que lhe quero dizer, tanto quanto me é dado ler de si, e já li muito, é que a verdade dos seus texto é a única verdade que conta para o leitor, de tal modo que os questionamentos e reflexões que nos traz, com a verdade e elegância que lhe são próprios, acabam por tornar-se, por isso mesmo, questionamentos e reflexões de quem lê. Grato, pela minha parte.
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