Um episódio secundário do festival de Veneza, contado no DN por Eurico de Barros. Will Jimeno, o verdadeiro, não a personagem, ficou agastado com os risos que o público dedicou a uma das cenas do filme World Trade Center. A visão de Cristo numa situação limite. Jimeno sentiu-se ofendido porque, diz ele, viu mesmo Cristo. E diz que qualquer um rezaria naquele momento. Mesmo os ateus. Não interessa muito questionar o grau de realidade que um filme deve transmitir, mesmo se baseado em acontecimentos reais. Oliver Stone deve ter tomado as suas decisões, e ao mostrar a visão de Jimeno sabia que tipo de reacção poderia obter. Empatia da maior parte dos crentes e do público em geral, incompreensão de parte da crítica. Pensaria eu, se tivesse no seu lugar. Deve ser sempre difícil gerir cenas emocionais em filmes. Ou se opta pelo melodrama puro, e aí é obrigatória uma sensibilidade que apenas está ao alcance de alguns - o durão Clint Eastwood, por exemplo, é um dos melhores exemplos. Ou então fica-se pelas meias-tintas e perde-se o filme. Neste caso, a cena inclui uma dificuldade extra: mostrar a encarnação da fé de uma personagem. Que eu me lembre, apenas dois realizadores me conseguiram convencer da existência de Deus por momentos: Carl Dreyer, em "A Palavra", e Lars von Trier, em "Ondas de Paixão". A pós-modernidade, que não precisa de crenças nem conversões religiosas, escarnece da religiosidade humana, que vê como ultrapassada e necessariamente anti-moderna. Que Dreyer e von Trier (por sinal, ambos dinamarqueses, de criação evangélica, apesar da conversão do segundo ao Catolicismo) tenham conseguido filmar de forma séria (isto é, não risível) a Fé, parece-me quase um milagre. Coisa rara e antiquada.
[Sérgio Lavos]
[Sérgio Lavos]
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