Há outros filmes como este. É um dos mais belos pretextos para contar uma história de amor - todas as comédias screwball se alimentavam deste truque. Recentemente, tivemos o caso de Mr. Smith e Mrs. Smith, que veio a redundar em Mr. e Mrs. Brad Pitt. Mas John McTiernan, em O Caso Thomas Crown, remake do original realizado por Norman Jewison em 1968, com Steve McQueen e Faye Dunaway, consegue desempenhar a função superiormente.
O filme arranca com um roubo de um milionário enfastiado (e psicanalisado por uma Dunaway em quase-cameo), e com uma mulher-fatal pouco convencional perseguindo o criminoso. Pierce Brosnan, lamentavelmente, limita-se a ser um James Bond no filme errado. Mas Rene Russo reequilibra a questão. A artificialidade fatal da personagem é desarticulada por dois ou três pormenores inteligentes do argumento - Rene Russo a beber uma cola, a engolir uma mistela vegetariana depois de uma noite mal-passada, a idade. E esta é a principal arma do remake; enquanto que no original o canastrão estiloso McQueen andava às voltas com uma Dunaway virginalmente jovem, aqui Brosnan atrapalha-se com o charme balzaquiano da investigadora. Deixámos o reino fantasmático de Hollywood, com os seus homens maduros exibindo uma masculinidade irresístivel para mulheres vinte anos mais novas - mito aliás evocado na relação de Brosnan/Crown com a loura nórdica que se vem a revelar apenas uma figura filial - e caímos numa realidade de quarentões desencantados, D. Juans e femme-fatales em declínio, procurando a tranquilidade de uma vida doméstica. A cada um a sua metade perdida, e no filme de McTiernan isso significa o gato encontrar o rato e comê-lo - com a preciosa colaboração do rato, claro; todas as migalhas estão à vista.
Que John McTiernan consiga contar esta história com um rigor formal notável, não surpreende. Pena é que não tenha acontecido ao realizador o que aconteceu a James Cameron com o seu mastodonte "Titanic": a consagração dentro do sistema. Ambos expoentes máximos de um género - o cinema de acção sofisticado -, mas McTiernan menos imediatista, mais trabalhado, que Cameron. Basta comparar "Assalto ao Arranha-Céus" com "Exterminador Implacável II". O primeiro leva a palma, de longe.
Um dia, McTiernan há-de fazer filmes como Clint Eastwood.
Que John McTiernan consiga contar esta história com um rigor formal notável, não surpreende. Pena é que não tenha acontecido ao realizador o que aconteceu a James Cameron com o seu mastodonte "Titanic": a consagração dentro do sistema. Ambos expoentes máximos de um género - o cinema de acção sofisticado -, mas McTiernan menos imediatista, mais trabalhado, que Cameron. Basta comparar "Assalto ao Arranha-Céus" com "Exterminador Implacável II". O primeiro leva a palma, de longe.
Um dia, McTiernan há-de fazer filmes como Clint Eastwood.
[SL]
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