O turista julga entender a alma do lugar que visita por alguns dias apenas, o viajante sabe que nunca conseguirá compreender o que sente um povo. Nascemos com a nossa terra no sangue, e nem que passemos anos fora perderemos essa marca de nascença.
Podemos fingir, cedendo um pouco à ilusão de conhecer. Em Barcelona, passeando entre "tourist spots" apinhados de gente com máquinas numa mão - digitais, que se perdeu para sempre a imagem do turista japonês de Nikon ao pescoço - e guia na outra, deparo com um breve (e ilusório) lapso da vida de quem pertence àquele lugar. Num parque com rampas para skaters, entalado entre prédios de cimento pouco típico e muito proletário, destaca-se um grupo, dois adolescentes e um homem mais velho. De início, não reconheço o objecto que o mais velho traz nas mãos. Dispõem-se em campo, o mais velho e um dos adolescentes frente-a-frente. O segundo saca do bolso uma bola de ténis e lança-a ao outro, que maneja o bastão de modo para mim inaudito. Coloca-o na vertical, amortecendo a pancada da bola, que ressalta e bate uma vez no chão antes de chegar às mãos do remetente inicial. Jogam cricket, entre muros, e o terceiro observa-os. São todos asiáticos, paquistaneses ou indianos. Em volta, os adolescentes catalães usando roupas largas e penteados trendy saltam nos skates, jogam à bola contra a parede do fundo, alguns com camisolas de Ronaldinho, Deco, Eto'o, vestidas. Os asiáticos, passado algum tempo, desistem do passatempo. E juntam-se a um grupo, começam a chutar uma bola de futebol de pé para pé, com mais ou menos talento para o jogo.
Ao afastar-me preferi não dar demasiada importância ao hiato de tempo que transcorreu naqueles breves minutos de actividade desportiva. Primeiro, o jogo dos pais e dos avós, a herança deixada pelos colonos que ocuparam o país durante 400 anos. Depois, o jogo do país onde nasceram, ou do país que os adoptou, tanto faz para o caso, acolhendo no seu património genético a nova terra que se entranha.
A conversa de integração não faz sentido nesta história. Eu era apenas um turista a caminho de mais um museu, sem qualquer desculpa para estar ali, na margem da cidade que visito.
Hoje, o grande tema é mais uma ameaça terrorista. Há canais de televisão que dizem que os suspeitos são jovens britânicos islâmicos, provavelmente asiáticos, como os do atentado no metro londrino, quem sabe como os adolescentes que vi jogando cricket em Barcelona. Não há espaço para moral nesta história. Os caminhos de um Homem são quase sempre um insondável mistério.
Podemos fingir, cedendo um pouco à ilusão de conhecer. Em Barcelona, passeando entre "tourist spots" apinhados de gente com máquinas numa mão - digitais, que se perdeu para sempre a imagem do turista japonês de Nikon ao pescoço - e guia na outra, deparo com um breve (e ilusório) lapso da vida de quem pertence àquele lugar. Num parque com rampas para skaters, entalado entre prédios de cimento pouco típico e muito proletário, destaca-se um grupo, dois adolescentes e um homem mais velho. De início, não reconheço o objecto que o mais velho traz nas mãos. Dispõem-se em campo, o mais velho e um dos adolescentes frente-a-frente. O segundo saca do bolso uma bola de ténis e lança-a ao outro, que maneja o bastão de modo para mim inaudito. Coloca-o na vertical, amortecendo a pancada da bola, que ressalta e bate uma vez no chão antes de chegar às mãos do remetente inicial. Jogam cricket, entre muros, e o terceiro observa-os. São todos asiáticos, paquistaneses ou indianos. Em volta, os adolescentes catalães usando roupas largas e penteados trendy saltam nos skates, jogam à bola contra a parede do fundo, alguns com camisolas de Ronaldinho, Deco, Eto'o, vestidas. Os asiáticos, passado algum tempo, desistem do passatempo. E juntam-se a um grupo, começam a chutar uma bola de futebol de pé para pé, com mais ou menos talento para o jogo.
Ao afastar-me preferi não dar demasiada importância ao hiato de tempo que transcorreu naqueles breves minutos de actividade desportiva. Primeiro, o jogo dos pais e dos avós, a herança deixada pelos colonos que ocuparam o país durante 400 anos. Depois, o jogo do país onde nasceram, ou do país que os adoptou, tanto faz para o caso, acolhendo no seu património genético a nova terra que se entranha.
A conversa de integração não faz sentido nesta história. Eu era apenas um turista a caminho de mais um museu, sem qualquer desculpa para estar ali, na margem da cidade que visito.
Hoje, o grande tema é mais uma ameaça terrorista. Há canais de televisão que dizem que os suspeitos são jovens britânicos islâmicos, provavelmente asiáticos, como os do atentado no metro londrino, quem sabe como os adolescentes que vi jogando cricket em Barcelona. Não há espaço para moral nesta história. Os caminhos de um Homem são quase sempre um insondável mistério.
[SL]
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