...lia um texto sobre blogues, e lembrava-me de como é fácil cair em certas armadilhas. Julgava eu, que escrevendo, me sobraria tempo para pensar sobre o escrito. Catadupa - catadupa, escrevia, sem pensar, primeiro rascunho. E ali brilhava o texto, e eu publicava, e estava tudo pronto, e seria necessário reafirmar o medo que prendia a solidão a um canto do quarto. O canto oposto de onde escrevo - a geometria da escrita depende da mudança das estações; o sol declinado sobre o monte de jornais, quando a tarde se emociona; o rádio ligado, Lou Reed sintonizando a sua estação preferida - estação certa na estação certa, primavera, a caminho do sol. A margem entre a sombra e a luz era um canteiro - e não quero com isto retirar força à literalidade da paisagem; não há metáfora que possa condenar a realidade. Realmente lia, realmente escrevia e realmente fazia primavera sobre as manchas pretas dos jornais acumulados; e a solidão amedrontava-se. Um passo em falso, o alçapão, um focinho de toupeira que espera; a mão sobre o jornal, e de como provavelmente poucas palavras serão capturadas pela ave de rapina que dá pelo nome de leitor de blogues. Um texto armadilhado, o possível quando o cansaço é um aperto amoroso no texto contínuo que vai nascendo. Não tenho palavras preferidas, nenhuma presa guardada na jaula. Todas me fogem, e na sua voluptuosidade matreira levam a minha última esperança de descanso, de silêncio.
Na verdade, há em cada intervalo no silêncio que compõe este texto um inimigo. Quando escrevo, combato; e quase sempre caio por terra. E nem posso dizer - como um pássaro. A liberdade de um combatente é nula. E continuo a ler, enredado na mira do inimigo meu amigo. Meu amigo.
Na verdade, há em cada intervalo no silêncio que compõe este texto um inimigo. Quando escrevo, combato; e quase sempre caio por terra. E nem posso dizer - como um pássaro. A liberdade de um combatente é nula. E continuo a ler, enredado na mira do inimigo meu amigo. Meu amigo.
[Sérgio Lavos]
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