23/03/08

Ai, pobre de mim

Que lamúrias deve estar neste momento o Calimero Pacheco* a congeminar, para continuação da sua crónica fabulosa sobre a opinião de litro? As "armas de destruição massivas" (perdoe-se o português sofrível), parte 2. A verdadeira questão deveria ser: por que razão ainda me dou ao trabalho de esperar por um arrependimento, uma contrição, uma dúvida que seja? Deveria ter desistido há muito tempo. Eu, pecador pertencente à furiosa "turba", me confesso, e acrescento um link mais para ele se sentir perseguido por meia blogosfera (que digo eu? blogosfera inteira). Coitadinho, que nem tem direito a debitar a sua sabedoria de pintainho num jornal com uma tiragem diária de 60 000 exemplares, mais uma revista semanal com 30 000, mais um programa de televisão visto por algumas centenas de milhar. A piedade que Calimero me merece apenas é atenuada pela raiva com que ataco a América; eu humildemente admito que sou um anti-americano primário (como milhões de nativos daquele território a norte do México que se preparam para votar em Barack Obama ou Hillary Clinton). Eu juro que nunca vi, e desprezo, filmes produzidos em Hollywood; juro que nunca ouvi, e lamento, Lou Reed ou Tom Waits, Strokes ou LCD Soundsystem, Bob Dylan ou Talking Heads; juro que nunca li, e detesto, autores como Poe ou Melville, Faulkner ou Fitzgerald, DeLillo ou Cormac McCarthy. Portanto, anti-americano primário, c'est moi (por isso falo francês). Não há qualquer argumento racional que eu possa usar para atacar a limpa e organizada invasão do Iraque. O caos que se seguiu, as pessoas que morreram, as consequências duradouras que todos prevêem para a região, tudo mentira, manipulações, demências de quem pensa mais com o seu primitivismo anti-americano do que com o cérebro. Pensamento controlado por ideologias pré muro de Berlim? Sou eu, o meu retrato perfeito. Admito, nunca me converti ao Santo Mercado, continuo a acender velinhas por Marx, Lenine, Trostki e Mao. Pois que Calimero tem razão. E tem razão com letras garrafais, enquanto nós, os milhares que o acossam, temos direito apenas a migalhas, míseros pontos negros na virtualidade blogosférica.
Calimero Pacheco, camarada, sofro consigo no seu isolamento. Acredite, o facto de poder ler um texto como o de Paulo Pinto, no Cinco Dias, que tem mais seriedade por centímetro quadrado do que qualquer quilómetro debitado pela sua pena, dá-me um gozo irreprimível. Há justiça no mundo: vozes de burro não chegam ao céu mediático - a constelação na qual Calimero Pacheco brilha acima de todas as estrelas. A turba será derrotada!

*Expressão cunhada pelo Pedro Vieira

[Sérgio Lavos]

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