A narrativa de Kerouac remonta a outros tempos. Não se trata propriamente de uma diferença temporal, do modo de vida americano alternativo dos anos 60, da Geração Beat, mas antes de um modo intenso e dramático de sentir a vida, de sentir tudo e de todas as maneiras. A prosa de Kerouac enche-se, por isso, dessa sensibilidade e dessa falsa ingenuidade, por vezes obscena, porque se trata de uma prosa excessivamente poética e excessivamente fluida. Uma quase obra-prima da corrente de consciência publicada em 1958 e de inspiração autobiográfica. A isto junta-se a bela cidade de São Francisco, a cidade da Golden Gate de Vertigo, a cidade de Kerouac, assim descrita:
"-Ela estava na ruela, sem saber bem quem era, em plena noite, um chuviscar miúdo de névoa, silêncio na São Francisco adormecida, os ferries para Berkeley e Oakland na baía, a baía envolta na mortalha dos nevoeiros de bocarra feroz, a auréola de luz estranha e sinistra que se elevava no meio, brotando de Alcatraz com as suas colunatas de templo antigo, o manto raso dos seus arcos de claridade-"
Os Subterrâneos (trad. e intr. Paulo Faria), Relógio D'Água, pág.49.
[Susana Viegas]
Os Subterrâneos (trad. e intr. Paulo Faria), Relógio D'Água, pág.49.
[Susana Viegas]
Sem comentários:
Enviar um comentário