10/10/06

Antes do amanhecer

Os dias. Os dias aparentam prolongar-se além do verão que terminou. Sinais que se repetem, o calor e a disposição amena da multidão suburbana a caminho dos empregos. Ainda não se vêem camisolas de lã, poucos chapéus, a depressão sazonal teima em acampar ao largo, os espíritos sobrevivem à luz da derradeira humanidade estival. Nem o trânsito se denuncia. O gigantesco animal do mundo enrola-se com gestos pré-históricos à cidade presa num tempo cego e estagnado, os veículos fluem mais devagar mas continuam a chegar ao seu destino, há poucos acidentes a reportar, o metro nunca pára.
Talvez anseie o frio, apenas isso. Coitados dos ossos, atraindo a película de tristeza em redor, aquela que se destaca naturalmente em altura de hesitação e pudor da vida violenta. Um país que não sobrevive ao gelo e à neve não merece a alegria do ciclo das estações, as celebrações pagãs que se perpetuam em regiões a norte de qualquer esperança.
Será saudades do verão, e confesso a minha genealogia maldita. Trocava de bom grado a luz esquecida da estação anterior por um pouco de frio de... por exemplo, Viena. Seis meses depois, o tempo que não se lembrou da hora marcada. A bolha cresceu até ao limite urbano da cidade. E eles já não estavam lá.

[Sérgio Lavos]

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