Depois da música inicial, as imagens fundem-se no som da natureza envolvente, e Blake torna-se parte dos lugares por onde anda. Uma mancha na floresta, em movimento, silenciosa, algo que está a deixar de ser humano.
Num filme que é suposto retratar os últimos dias de Kurt Cobain, a música que ouvimos é escassa. Gus van Sant prefere que os ruídos naturais se evidenciem - o som de pássaros por entre as árvores, o crepitar das folhas secas sob os pés, a água da cascata a correr, o baque do corpo na corrente, a fogueira ardendo no escuro, o grito primitivo do músico, o comboio na distância. A ilusão é perfeita: o som não é captado de forma directa, mas inserido na pós-produção, resultando em sequências que podem ser apenas ouvidas, representação bastante aproximada da ideia de uma realidade; e panteísta, como sucede em Gerry, a longa caminhada dos dois Gerrys para a morte, os passos sobre a areia multiplicando-se sobre si próprios.
Como se a morte se insinuasse através de um desejo primordial de regresso à Natureza. Longe da multidão enlouquecedora. Um Walden pós-moderno.
[Sérgio Lavos]
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