08/02/08

Passar por estranho

Há cerca de um mês que não ouvia The National - mas continuo a fumar; ninguém é perfeito. Uma passa agora mesmo, na Radar, o lado B de Mistaken for Strangers (White Dance, White Trash?). Darjeeling Limited. não é tão bom como poderia ter sido, mas é melhor do que parece ser. Ou então, como escreveu a Rita (procurar texto), a minha é de facto a geração que se sente confortável como personagem de um filme de Wes Anderson. A geração que adormece a ouvir The Smiths e acorda com The National, sonhando pelo meio com Radiohead. Curiosamente, o que se ouve mais nos filmes de Anderson é música dos anos 60. Um mimo. Aqui há dias morreu o guru dos Beatles, e lembrei-me disso enquanto via o filme. Quarenta anos depois, perdemos a paciência para crises existenciais curadas pelo misticismo perdido da Índia; apesar de corrermos o risco de tropeçar num qualquer guru contratado por um daqueles resorts paradisíacos do Índico, enquanto bebemos um daikiri à sombra de uma palmeira e somos servilmente servidos à velha maneira colonial. Os novos burgueses místicos não diferem muito dos antigos lordes ingleses; damos outros nomes à exploração. Kinks, então, com sitar e tudo. Paisagens estranhamente desfocadas, o lugar comum da beleza tingida pelo desperdício. Seja na Índia ou em Nova Iorque, a família como lugar de desagregação. Ou outro modo de dizer que o tédio pós-moderno permite-nos culpar os progenitores pelos nossos próprios falhanços. Pelo vazio que se instala. Precisamos de imagens? Os núcleos familiares corroídos de Wes Anderson. E de música? Mistaken for Strangers depois de Babies, dos Pulp.
Mas há pormenores no filme de Anderson a precisarem de um código. O sabor que fica na boca.

As reuniões familiares são estaleiros onde navios
se despem de artérias e tendões, revelando os ossos,

a pele uma dobra invertida, os afectos - sussurros

acumulados na evocação da verdade, a memória falsa.

[Sérgio Lavos]

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