Longas viagens de comboio, ao contrário do que me dizem, não são necessariamente um mal. O corpo habitua-se, e dá para ir vendo a vida compactada em páginas, ou, sem metáfora à mistura, ler livros e jornais sem culpa e com tempo em abundância.
A entrevista de Alexandra Lucas Coelho a Luandino Vieira tem o mesmo ritmo de uma viagem de comboio - ainda assim, dura menos do que esperamos, do que desejamos. Surpreendido pela reclusão interrompida ou pela fama desprovida de razão de que o escritor gozava - imagino que haverá alguma cedência à vaidade nesta conversa com o Público. E sei que o prémio foi recusado - parece-me que por razões práticas, sem mais.
Enquanto as páginas dos suplementos de literatura dos jornais forem ocupadas com peças como a de hoje (e o gozo da crónica de Mário Santos, claro - por favor, não o publiquem. Ele não precisa de concorrer com objectos que nada têm que ver com literatura. Deixem-no com a sua biblioteca de papel semanalmente alimentada.) Escrevia (não dizia) que enquanto as páginas dos suplementos não forem tomadas de assalto pelas brigadas dos clones de livros que surgem debaixo de cada pedra em que se tropeça, não estamos completamente perdidos.
Como poderá alguém não defender a protecção da criação marginal? Se é aí que reside a força de qualquer arte, da literatura à música, passando pela pintura ou o cinema. Quem cria tendo em mente um gosto abrangente e universal, corre sempre o risco de produzir repetição, nunca gerar diferença.
Luandino Vieira (conversa política à parte, mas raramente os escritores conseguem entender o mundo que os rodeia) fala como escreve, caminha como fala - e escrever é quase sempre um exercício de redundância e fuga, aproximação e reencontro, um passeio pelos campos que nos são familiares.
O comboio chega à estação, é noite perdendo-se na noite. Fecho o jornal e saio.
A entrevista de Alexandra Lucas Coelho a Luandino Vieira tem o mesmo ritmo de uma viagem de comboio - ainda assim, dura menos do que esperamos, do que desejamos. Surpreendido pela reclusão interrompida ou pela fama desprovida de razão de que o escritor gozava - imagino que haverá alguma cedência à vaidade nesta conversa com o Público. E sei que o prémio foi recusado - parece-me que por razões práticas, sem mais.
Enquanto as páginas dos suplementos de literatura dos jornais forem ocupadas com peças como a de hoje (e o gozo da crónica de Mário Santos, claro - por favor, não o publiquem. Ele não precisa de concorrer com objectos que nada têm que ver com literatura. Deixem-no com a sua biblioteca de papel semanalmente alimentada.) Escrevia (não dizia) que enquanto as páginas dos suplementos não forem tomadas de assalto pelas brigadas dos clones de livros que surgem debaixo de cada pedra em que se tropeça, não estamos completamente perdidos.
Como poderá alguém não defender a protecção da criação marginal? Se é aí que reside a força de qualquer arte, da literatura à música, passando pela pintura ou o cinema. Quem cria tendo em mente um gosto abrangente e universal, corre sempre o risco de produzir repetição, nunca gerar diferença.
Luandino Vieira (conversa política à parte, mas raramente os escritores conseguem entender o mundo que os rodeia) fala como escreve, caminha como fala - e escrever é quase sempre um exercício de redundância e fuga, aproximação e reencontro, um passeio pelos campos que nos são familiares.
O comboio chega à estação, é noite perdendo-se na noite. Fecho o jornal e saio.
[Sérgio Lavos]
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