23/12/12

Feliz Natal

Houve um tempo em que se lastimava
a fúria materialista do Natal,
o consumismo enlouquecido das multidões
nos centros comerciais, gastos supérfluos,
compras compulsivas, o frenesim dos presentes
e a alegria das crianças depois da consoada,
quando assaltavam os pés da árvore e se
dedicavam à selvageria da comparação e da inveja,
a alegria de quem não sabe, nem sonha, o que poderá
querer dizer aquela expressão dos pedagogos
que entrou na boca do povo, “a inocência das crianças”,
hábitos que vêm do berço e se aprimoram na
simulação de vida a que por conveniência se chama “família”.

Houve um tempo em que se lamentava
que as “pessoas” tivessem esquecido os valores cristãos
da época, a caridade e o amor, a partilha e o calor
da lareira pela noite fora, o sono
antes da parca prenda dos humildes colocada no sapatinho,
a missa à meia-noite, ao bater das badaladas, o senhor prior
piando a palavra do Senhor, e a esmola aos pobres
postados na porta da igreja.

Houve um tempo em que nem presentes havia,
apenas o fio da espada, a fome e a violência,
jornadas no deserto e conquistas dos exércitos,
morte, destruição e ruína redimidas
pela vinda do Cristo que a fio de espada, fome e violência
conquistou em poucos séculos o território

onde agora se lamenta que as crianças já não
possam gritar e as “pessoas” não possam comprar
sem constrangimentos, que já não se alimente
o comércio pouco tradicional e que já
não se possa chorar a perda dos valores de antigamente,
a caridade, a oferenda, a compaixão.

Este é o tempo de Deus, entre os homens,
quando os ricos poderão voltar
a entrar no Reino dos Céus porque perderam tudo
e agora se postam na porta da igreja
à espera da esmola que antes davam.

Já ninguém lastima a fúria materialista do Natal.
Agora pede-se um regresso às tradições de antigamente –
ao consumismo enlouquecido das multidões
nos centros comerciais, aos gastos supérfluos,
às compras compulsivas, ao frenesim dos presentes
depois da consoada.

As crianças, essas, ainda andam por aí.

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