31/08/08

Paisagens

Chegará um tempo em que nenhum pedaço de terra e mato estará disponível para nos evadirmos. Ou então nenhum tempo chegará, porque desapareceremos entretanto.
Mais do que saber quando se extinguirá o planeta, interessa-me saber quantas gerações poderão ainda viver como eu vivo. E se quero fazer algum esforço para prolongar esse número.
O último dia de verão (é sempre em Agosto) passado a registar o desaparecimento da natureza. Em três anos, desde que me mudei, foram construídas pelo menos mais três urbanizações num raio de um quilómetro. Das traseiras do meu apartamento, eu podia ver uma encosta coberta de erva brava, e a meio caminho uma triste oliveira, por vezes assombrada por um cão vadio. Agora, a oliveira resiste, mas uma fileira de aberrações castanhas e amarelas encima a encosta, espreitando sobre os telhados do meu bairro. Os montes em redor polvilham-se de betão, postes e fios eléctricos, estradas rasgando a paisagem.
Não sei o que é pior: acreditar que existe um PDM que permite este tipo de construção ou aceitar que ninguém, na realidade, respeita o PDM existente. E, no fim de contas, também eu me mudei para um prédio que veio arruinar a paisagem e a paciência de quem ainda tinha vista para as árvores.
Do alto dos montes, onde subi, a humanidade alastra como: uma vaga de vitalidade, se acreditarmos em Walt Whitman; um cancro incurável, se cedermos ao apelo dos pessimistas.
Escolha quem quiser; eu limito-me a assistir na primeira fila.

[Sérgio Lavos]

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