31/05/07
30/05/07
Madeleine
Mas Pedralbes é mais do que medo e salvação, histórias contadas para assustar crianças. É um fantasma de um filme. Em "Vertigo", de Hitchcock, Scottie persegue Madeleine até uma missão católica, Dolores. Madeleine entra na capela e um som de órgão ouve-se. Julgamos que alguém toca, no filme. Engano, a música está na banda-sonora. Em Pedralbes, entrei na capela atraído pelo som de música. Da rua, quase não se ouvia. Lá dentro, as ondas sonoras, vindas de algum canto invisível, inundavam o espaço. Sentei-me ali, e imaginei Madeleine a desaparecer por uma porta ao canto do altar. Scottie vem depois, a música perseguindo-o. Nasce da tela - a capela mantém-se enclausurada em silêncio. Scottie sai, a música continua. Na capela do convento de Pedralbes, nenhuma porta se via do lado direito do altar, nenhuma porta desembocava no cemitério onde descansa Carlotta Valdes. A música, entretanto, parou. Imagino que não vejo a freira que saiu de uma sala até aí escondida, imagino que a música de Bernard Hermann continua a soar enquanto o olhar triste de Madeleine se detém na pedra fria do túmulo de Carlota, enquanto Scottie espreita, ali perto. No claustro de Pedralbes, um ritual antigo se repete. No silêncio e na sombra, um homem regressa à sua natureza. E reconhece na obsessão o antídoto para o medo.
[Sérgio Lavos]
Água turva
[Sérgio Lavos]
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[Sérgio Lavos]
25/05/07
Zodiac (3)
[Sérgio Lavos]
Zodiac (2)
[Sérgio Lavos]
Zodiac
[Sérgio Lavos]
23/05/07
Fanáticos
O problema tem que ver com a natureza das duas funções. O político é, quase sempre, um ser desprovido de imaginação que compensa esta falta com uma tendência para a mentira, a falsidade ou a grandiloquência, muitas vezes ocorrendo separadamente e, nos casos mais sintomáticos, juntas. Pior ainda, o político confunde mentira com imaginação e inclui-se muitas vezes nos seus delírios mitómanos, achando que o poder que lhe foi delegado lhe confere carta branca para entrar na História. Todo o político sonha com a eternidade. Quase todos apenas conseguem notoriedade ou, nos piores casos, enriquecimento ilícito, durante algum tempo.
O escritor é alguém que usa a criatividade para produzir novas imagens, nunca mente. Está suficientemente protegido para poder praticar o seu ofício sem sobressaltos. Sabe que quem lê não espera mais do que outra realidade, diferente daquela onde vive. Diferente de uma realidade onde a mentira e a hipocrisia são indissociáveis da socialização. Neste mundo, o político move-se como uma enguia entre as mãos.
Amos Oz, escritor israelita, no livro do Público que saiu há uns tempos, "Contra o Fanatismo", traça uma linha entre escritor e político, definindo um modo de intervenção que tanto se aproxima do engagement clássico como se afasta - Oz nunca toma partido por nenhum dos lados, israelita ou palestiniano. O mais difícil de conseguir, a neutralidade absoluta; principalmente porque Oz é israelita e de esquerda - facilmente podia descambar para um dos lados. Os três ensaios do livro são extraordinários, e mais exemplares se tornam quando chegamos ao fim a achar que nenhuma das sugestões avançadas por Oz serão sequer pensadas pelos líderes políticos a quem ele apela. Oz, como outros intelectuais israelitas e palestinianos, labora no fracasso. Porque pertence a uma espécie diferente dos líderes políticos - os tais homens sem imaginação, reduzidos à insignificância de poderem mandar no presente. E de saberem que nunca irão transformar o futuro.
[Sérgio Lavos]
Touradas
[Sérgio Lavos]
Meditatio
Inclino-me a achar
Que o Homem é o animal superior.
Quando penso nos curiosos hábitos do Homem,
Meu amigo, confesso, fico baralhado.
Ezra Pound
(versão de)
[Sérgio Lavos]
18/05/07
Paisagem com queda de Ícaro
quando Ícaro caiu
era primavera
um agricultor lavrava
o campo
todo o esplendor
do ano acordara
e crepitava
à
beira-mar
preocupado
consigo mesmo
suando ao sol
que derretia
a cera das asas
acidentalmente
ao largo da costa
aconteceu
um mergulho surdo
era
Ícaro que se afogava
William Carlos Williams
(versão de )
[Sérgio Lavos]
17/05/07
Arte e imanência (2)
[Sérgio Lavos]
14/05/07
No Direction Home
O meu filme preferido de entre os que Martin Scorcese dirigiu é “No Direction Home: Bob Dylan” – e o segundo bem poderia ser “A Minha Viagem em Itália”. E arriscaria ainda um terceiro: "The Last Walz”. Arrisco deitar fora “O Touro Enraivecido” e principalmente a sua melhor obra de ficção, “Taxi Driver”. Guardando os seus documentários religiosamente.
Que Scorcese consiga ser melhor quando fala das suas paixões não deixa de ser surpreendente. Ou pensando bem, não é. Porque Scorcese é um meticuloso cinéfilo que enriquece a sua obra com o conhecimento adquirido na obra de outros. É claro que existe um modo scorcesiano de fazer cinema – aquela maneira de acumular tensões sem nunca mostrar verdadeiramente um núcleo dramático que justifique essas tensões; e isto é uma qualidade. Quando Travis Bickle, em "Taxi Driver", finalmente cede aos demónios interiores, o ritmo do filme torna-se decrescente, um balão esvaziando-se até que nada reste. A violência não é gráfica nem explosiva; é um esgar no rosto de Robert de Niro ou uma improvisação em frente ao espelho. Nada acontece apenas uma vez. Uma continuidade nos actos da personagem de Bickle imita as flutuações constantes da cidade de Nova Iorque, o seu pulso. Tudo é normal na cidade que nunca dorme – e em "Nova Iorque Fora de Horas" confirma-se em tom de burlesco a loucura encenada de "Taxi Driver".
Falando de um filme, torna-se fácil ganhar-lhe apego. Regressemos portanto a "No Direction Home", fabuloso testemunho dedicado a alguém que já está além da História – da sua injustiça suprema, dos seus ciclos inevitáveis de vida e morte. E acaba por ser tudo menos curioso que Bob Dylan, uma das mais perfeitas encarnações do Homem americano, tenha sobrevivido ao peso de o ser persistindo numa reclusão casmurra, encerrado numa misantropia que é o espelho do seu génio. O documentário de Scorcese esquiva-se a grandes teorias – sempre uma armadilha – e concentra-se nos pormenores. As entrevistas perigosas, no fio da navalha; o relato dos músicos que o acompanharam; a reacção do público conservador da música folk aos concertos electrificados da digressão de "Bringing It All Back Home" – o seu álbum esquizofrénico; a zanga com Joan Baez.
O mistério de Dylan fascina por ter criado uma obra que configura o espírito de um tempo. E Dylan apenas se tornou um mito quando se rebelou contra as suas raízes e se reinventou enquanto músico. Em 1965, Dylan previu o fim da utopia do movimento hippie? Não será assim, apenas prosseguiu o caminho de uma outra utopia; no caso, criativa, espaço de singularidade artística. O seu maior feito – que ele, como se vê em "No Direction Home", acaba por desvalorizar em termos de importância simbólica. Scorcese capta o percurso feito de desvio e transgressão, focando o seu olhar nos pormenores, seja uma entrevista ao músico em que este é provocado por um jornalista de intenções duvidosas, seja no relato feito no tempo presente, em que Dylan se expõe revelando as sombras desconhecidas da sua história.
Ao conhecermos o músico na intimidade das histórias durante tanto tempo guardadas, compreendemos melhor a razão das mudanças que ocorreram nos últimos 40 anos na América. Mérito para Martin Scorcese. Partindo do particular para o universal, tornando a micro-história pista de leitura para a grande História, sobretudo asseverando a importância da cultura pop para o entendimento pleno de uma sociedade, Scorcese atingiu a perfeição. Que tenha assim sucedido em forma de documentário, não me parece que venha mal ao mundo. O cinema também pode servir como testemunha de um tempo que vai passando. Para sempre.
[Sérgio Lavos]
13/05/07
Arte e imanência (1)
No interior do edifício, a obra de Carsten Höller, o escorrega, perdia a intensidade de obra-de-arte (duvido que a maior parte dos visitantes que pagaram para descer por ali soubessem que aquilo era uma instalação artística) para se reduzir a um objecto do quotidiano, exclusivamente utilitário. Parecia ser apenas um extra na oferta do museu: para além de arte, diversão.
[Sérgio Lavos]
11/05/07
Pré-qualquer coisa
[Sérgio Lavos]
10/05/07
Vonnegut e a arte
[Sérgio Lavos]
09/05/07
Regressos
"A luz é sempre igual, repete-se no seu regresso."
"Mas o calor, os pássaros vibrando com o calor que inflama o ar, o corpo intenso."
"A mesma luz, o mesmo calor, o mesmo cansaço."
"Mas o vento, nunca é o mesmo. O movimento das folhas nunca se repete. Tudo é novo."
"Todos os regressos se repetem. A luz dissipa a sombra do tempo. A sua permanência maldita. E apenas isso acontece. Apenas isso."
[Sérgio Lavos]
Lynchland (2)
[Sérgio Lavos]
04/05/07
LCD Soundsystem
I wish that we could talk about it,
But there, that's the problem.
With someone new I could have started,
Too late, for beginnings.
The little things that made me harassed,
Are gone, in a moment.
I miss the way we used to argue,
Locked, in your basement.
I wake up and the phone is ringing,
Surprised, as it's early.
And that should be the perfect warning,
That something's, a problem.
To tell the truth I saw it coming,
The way, you were breathing.
But nothing can prepare you for it,
The voice, on the other, end.
The worst is all the lovely weather,
I'm sad, it's not raining.
The coffee isn't even bitter,
Because, what's the difference?
There's all the work that needs to be done,
It's late, for revision.
There's all the time and all the planning,
And songs, to be finished.
And it keeps coming,
And it keeps coming,
And it keeps coming,
Till the day it stops
(Repeat x3)
And it keeps coming,
(Repeat x7)
Till the day it stops.
I wish that we could talk about it,
But there, that's the problem.
With someone new I could have started,
Too late, for beginnings.
You're smaller than my wife imagined,
Surprised, you were human.
There shouldn't be this ring of silence,
But what, are the options?
When someone great is gone.
(Repeat x8)
We're safe, for the moment.
Saved,
For the moment
Encurralados
Não há nenhuma diferença entre um puritano sexual e um proibicionista. A sua natureza assemelha-se. A ditadura do bem-estar começa a tomar conta do mundo. Queremos mulheres com a silhueta de raparigas de 13 anos, músculos tonificados aos 50 e uma morte limpa, sem sofrimento. Estimulamos a investigação científica e queremos encontrar a cura para todas as doenças (como se fosse possível morrer saudável) e ao mesmo tempo especulamos sobre a eutanásia e deixamos os velhos abandonados à sua tristeza em lares habitados por sombras de vivos. Merece mais atenção um pobre fumador que apenas deseja poder viver com o seu vício sem ser importunado do que um velho abandonado pela família como um cão.
Vamos sendo encurralados pela lei do mais forte. A democracia que protege as minorias esquece-se por vezes dos direitos das maiorias. Não desejo mais saúde nem bem-estar; apenas o direito de poder fazer o que quero, desde que não prejudique os outros. Mesmo que os outros me queiram prejudicar. A minha liberdade.
[Sérgio Lavos]
03/05/07
A meio do fim
A cinco páginas do fim de "Na Praia de Chesil", o último de Ian McEwan, é isto que me ocorre dizer.
[Sérgio Lavos]
01/05/07
Imagens
[Sérgio Lavos]
Off
[Sérgio Lavos]
Uma lolita
[Sérgio Lavos]