A última reformulação do suplemento Ípsilon parecia anunciar mudanças importantes. Num panorama de acelerada decadência dos suplementos culturais na imprensa escrita, foi importante a aposta do Público em artigos de fundo semanais, sobretudo porque os nomes convidados - Augusto M. Seabra e António Pinto Ribeiro - eram garantia absoluta de, como se costuma dizer, qualidade. Tem sido provado, ao longo dos últimos meses, que a decisão foi acertada - arrisco a subjectividade da observação sabendo que os números são o que dita a continuidade deste tipo de projecto. Com a circulação de jornais em acentuado declínio, provavelmente este acerto nada terá trazido de novo no aspecto comercial; e sabemos que, a longo prazo, tudo o que lamentamos será pouco, perante o que virá. Mas enquanto temos gente de quem gostamos a escrever para nós em jornais - e a troco de um valor, condição que ainda há pouco, por mais absurdo que nos pareça, foi posta em causa pelo novo dono do jornal I - desfrutemos do facto.
Acrescente-se a estes nomes a "contratação" da época, Rogério Casanova. Numa espécie de troca com o Actual, do Expresso - Pedro Mexia partiu para essas paragens - Casanova chegou, viu e, claro, venceu. O crítico mais prodigiosamente canibalesco e intertextual das redondezas é também o que mais se aproxima do modelo da crítica anglo-saxónica. Dêem-lhe espaço e ele brilhará - como o fazem os números 10. Acontece hoje - o texto de 4 páginas (um merecido luxo) sobre David Foster Wallace beija ao de leve o génio de um ensaio do próprio David Foster Wallace. Sei bem que a influência das leituras pode ser uma maldição - já nem vou pela coisa da angústia; Harold Bloom é, digamos, sobrevalorizado - mas, no que interessa, Casanova acerta. A flexibilidade do seu pensamento é a prova das muitas horas perdidas a malhar - hermeneuticamente falando - em Foster Wallace. E em James Wood, não descuremos essa aprendizagem. Depois do "momento Federer" e do "momento Foster Wallace", arrisco dizer que deveremos começar a pensar no "momento Casanova", numa banca perto de si. Se foi para isto que a sua Pastoral Portuguesa embarcou num prolongado pousio, abençoada reforma agrária.
(O retrato foi tirado pelo conhecido artista hiper-realista Pedro Vieira.)
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