12/09/11

A inconsciência e o romance

Calhou ter em mãos o livro de David Lodge, A Consciência e o Romance, quando me deparei com uma frase do escritor israelita Lev Grossman: «Being a novelist demands arrogance […] "To be a good critic, you have to be humble." Não há acasos que possam ser descuidados, mesmo em assuntos tão pouco importantes como a literatura, ou ridiculamente menores, como a crítica literária. Lodge é também um (excelente, embora não tão valorizado como deveria) romancista, mas é sobretudo respeitado pelo seu trabalho académico e crítico. O caso é simples: a arrogância deverá ser uma das qualidades de um bom escritor; a modéstia nunca terá sido boa conselheira. Depreendo que Grossman estará a falar daquela arrogância que obriga o escritor a prosseguir, quando a razão aconselha o contrário. A velha questão: como escrever, o que escrever, depois de tudo que já foi escrito? Imagino que a dúvida terá levado, ao longo do tempo, ao desespero e ao suicídio; ou pior, à desistência. Robert Walser foi dos mais sensatos: internou-se num hospício e inventou uma escrita aparentemente indecifrável (até alguns investigadores com demasiado tempo em mãos a terem decifrado), até à morte - de resto excessivamente romântica para os usos da época; nem a tísica, nem a morte de amor, nem a descoberta de um corpo sobre a neve; tudo tão batido como o ferro às mãos do metalúrgico.
Mas há quem continue a escrever; e publique; e apareça em todo o lado envergando o sobretudo do "autor". Um mercado dentro do capitalismo, vivo e aparentemente de boa saúde. David Lodge acha que foi Charles Dickens o primeiro autor famoso. Não uma celebridade - outros já o tinham sido antes dele. Famoso. Não sei se terá sido Dickens o único autor famoso que tinha, digamos, qualidades inegáveis como escritor. Depois dele, a decadência.
O problema de muitos escritores contemporâneos é que lhes sobra em empáfia o que lhes falta em talento. A arrogância não será uma virtude, mas sim uma necessidade. Para continuar. E falhar. E voltar a tentar.
Quanto à humildade do crítico, a verdade da frase de Grossman é mais um desejo do que a realidade. Como poderá um romancista conter um ego em busca de reconhecimento ao escrever sobre os outros? Os grandes conseguem. Os outros não são críticos. 

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