A perfeição não é apenas a simples geometria regular das ruas e a certeza dos acontecimentos. O caos francês talvez seja mais apaixonante do que o rigor alemão - e quem sabe, de entre as cidades que eu não vi, qual conseguirá conciliar estes dois extremos?
O longo passeio do primeiro dia, da ilha de Notre Dâme até à torre Eiffel, mostrou-me um postal vivo, aquilo que todos conhecem. A margem esquerda, alguns vendedores que começavam a montar banca - era cedo - os edifícios do outro lado e a estrada rente ao rio, serpenteando cima abaixo, a sucessão de pontes, construídas em momentos diferentes, e as rampas que descem da rua principal e acompanham a água a intervalos regulares, a margem esquerda culminando na visita a Orsay, a antiga estação transformada no museu com um imbatível espólio de impressionistas. Mas logo nessa primeira caminhada cunhei essa impressão de desequilíbrio: por baixo de Pont-Neuf, lá estavam eles, como se tivessem surgido do filme de Leos Carax, os vagabundos dormindo por entre os pilares, espreitando os turistas que passam. Até a miséria - fatalmente - pode ser romântica; e a associação aos amantes da ponte, Juliette Binoche e Denis Lavant, inescapável para quem conhece (ou apenas ouviu falar de) o filme embeleza o que não pode ter beleza. A estética compromete a ética.
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