23/07/09

O declínio da cultura francesa

Mais do que o declínio das letras francesas, o que se vê por cá, e neste caso o que cá se passa serve de falsa medida do mundo, é o progressivo desinteresse pela cultura e literatura de língua francesa. A língua inglesa é a língua franca do mundo actual, e um intelectual francófono uma espécie em vias de extinção. Esta verdade evidencia que esse declínio é, ou poderá ser, uma ilusão; porque o desinteresse é cada vez maior, cada vez menos se valoriza a literatura francesa. O Nobel de Le Clézio, o ano passado, foi recebido com alguma perplexidade um pouco por todo o lado, mas a realidade é que o desdém mostrado por cá não passou de um espelho do que passou nos E.U.A., o que reforça a ideia de um predomínio da cultura de língua inglesa.
Contudo, basta entrar numa livraria francesa para se perceber que a riqueza do panorama editorial é fulminante; a diversidade de edições, a aposta no livro de bolso, muito mais barato, a proliferação de traduções em todas as áreas das ciências sociais, e sobretudo a visível oferta de livros traduzidos da maior parte das língua existentes, feita sempre do original (é ponto de honra para os franceses, não há traduções em segunda mão, ao contrário do que acontece, tristemente, por cá), mostram que, de certo modo, o público francês está muito mais bem servido do que o inglês ou norte-americano. Não tendo acesso aos números reais, quer-me parecer que será muito mais fácil encontrar um poeta africano ou um romancista coreano numa livraria francesa do que numa inglesa. Não é uma questão de superioridade cultural, mas a verdade é que a abertura ao mundo é uma vantagem que se revela nesta característica do meio cultural francês. E bem podemos estar gratos que assim seja; é muito mais fácil encontrar um autor português traduzido em língua francesa do que em inglês. Muitas vezes com referências críticas nos suplementos culturais dos jornais ou em revistas especializadas, como aconteceu recentemente com Gonçalo M. Tavares e José Carlos Fernandes.

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