Para Control, Anton Corbijn não arriscou, não foi além da ilustração do que era já do conhecimento público, Ian Curtis era um depressivo apático mas um escritor fabuloso. O que é pena, pois se Corbijn não estivesse preocupado com o rigor, com uma vontade de “ressuscitar” Ian, a imaginação poderia ter guiado o filme. A imagem de Martin Ruhe é extraordinária, a gradual definição dos contrastes acentuando o preto sobre o branco é subtil, os actores não poderiam ser melhores, mas, no todo, Control é um cliché: era previsível que a imagem fosse a preto e branco e que as letras das músicas revelassem o espírito. Formalmente, é um filme que se leva demasiado a sério quando o tema em questão já era suficientemente fechado e sufocante. É natural que, para Corbijn, 24 Hour Party People de Michael Winterbottom seja apenas um filme engraçado porque, nos seus antípodas, Control é como um murro no estômago que pede aos espectadores uma constituição forte e uma vontade deliberada de sadismo.
Sem espaço para a criatividade que deveria ser o trabalho cinematográfico, sem imaginação no trabalho de argumento, é decepcionante esta recriação de uma vida tão irrepetível como a de Ian Curtis (e no entanto tão comum a tantos anónimos) porque não mostra uma visão pessoal sobre Ian. Se não fosse pela música dos Joy Division, iríamos ver um filme cinzento e angustiante, sobre um homem depressivo, apático, com uma vida cinzenta e monótona? Ainda que não houvesse interesse pessoal pelo artista, um bom realizador conseguiria criar uma personagem autónoma e não uma recriação do que todos já sabemos ter sido a vida de Ian Curtis.
Não fosse sobre Ian Curtis, dar-nos-íamos ao trabalho de ir ver Control? Não me parece porque, cinematograficamente, é um filme menor, ou, pelo menos, era de esperar mais de Anton Corbijn, mais do que a encenação das imagens que captou dos verdadeiros Joy Division enquanto fotógrafo; era de esperar que Corbijn fosse tão bom realizador quanto fotógrafo. O facto de ser uma filme sobre Ian Curtis é por si um tema redutor e, por isso, cabe à genialidade do realizador (não é o caso) criar a sua personagem ainda que só de raspão apanhe o original, ainda que só na diagonal diga respeito à vida dessa pessoa. Neste aspecto, um bom exemplo é Last Days de Gus Van Sant, onde Blake é uma personagem fictícia, é uma criação cinematográfica de Van Sant e não uma cópia de Kurt Cobain. Isto para dizer que um docudrama não deveria ser uma mumificação de alguém que se admira mas antes uma interpretação que faça diferença.
[Susana Viegas]
Sem espaço para a criatividade que deveria ser o trabalho cinematográfico, sem imaginação no trabalho de argumento, é decepcionante esta recriação de uma vida tão irrepetível como a de Ian Curtis (e no entanto tão comum a tantos anónimos) porque não mostra uma visão pessoal sobre Ian. Se não fosse pela música dos Joy Division, iríamos ver um filme cinzento e angustiante, sobre um homem depressivo, apático, com uma vida cinzenta e monótona? Ainda que não houvesse interesse pessoal pelo artista, um bom realizador conseguiria criar uma personagem autónoma e não uma recriação do que todos já sabemos ter sido a vida de Ian Curtis.
Não fosse sobre Ian Curtis, dar-nos-íamos ao trabalho de ir ver Control? Não me parece porque, cinematograficamente, é um filme menor, ou, pelo menos, era de esperar mais de Anton Corbijn, mais do que a encenação das imagens que captou dos verdadeiros Joy Division enquanto fotógrafo; era de esperar que Corbijn fosse tão bom realizador quanto fotógrafo. O facto de ser uma filme sobre Ian Curtis é por si um tema redutor e, por isso, cabe à genialidade do realizador (não é o caso) criar a sua personagem ainda que só de raspão apanhe o original, ainda que só na diagonal diga respeito à vida dessa pessoa. Neste aspecto, um bom exemplo é Last Days de Gus Van Sant, onde Blake é uma personagem fictícia, é uma criação cinematográfica de Van Sant e não uma cópia de Kurt Cobain. Isto para dizer que um docudrama não deveria ser uma mumificação de alguém que se admira mas antes uma interpretação que faça diferença.
[Susana Viegas]
9 comentários:
Sérgio,
Tiraste-me as palavras.
Já sabia que quando grande é a expectativa maior é probabilidade da frustração com a degustação do produto, mas, no final da exibição do filme, numa sala anacrónica da Medeia no Porto, disse para os meus botões: se não fosse o Ian Curtis a figura central, da qual já conhecemos pelos media e pela Literatura o desenlace e a vida até à sua ocorrência, considerá-lo-íamos um bom filme?
Abraços
André,
ainda bem que concordamos.
apesar da unanimidade das críticas que li e que o consideram um filme marcante, um novo alento o cinema britânico(!), não foi essa a minha impressão.
[vou pedir ao Sérgio para escrever sobre o filme!]
Susana,
Peço as minhas desculpas, não olhei para a assinatura do texto.
É a força do hábito...
Quanto a Control, só estou à espera que assentem algumas ideias, dada a minha excitação inicial. A poeira no ar ainda me deixa com aquele sabor amargo da frustração.
Mas aqueles planos, apesar de o filme dispor de um director de cinematografia que não Corbijn (fotógrafo de profissão), são simultaneamente esplendorosos e austeros.
Mil perdões pela troca de identidades.
Não se preocupe, a confusão já é um hábito.
huumm, será que susana e sérgio são uma e a mesma pessoa? nunca os vi juntos. quer dizer, por acaso já. raios, lá se vai a teoria da cabala. sem madonna.
"...iríamos ver um filme cinzento e angustiante, sobre um homem depressivo, apático, com uma vida cinzenta e monótona?". "Taxi driver", chegará como resposta?
Taxi driver chega, sim. mas sem esquecer que há aí uma grande vontade de mudar tudo, os outros principalmente, um espírito crítico e aberto à cidade, a personagem de de niro é muito interveniente, é um pessimista que exterioriza as ideias. o ambiente poderia ser o mesmo mas, na minha opinião, o resultado cinematográfico é muito diferente.
Apenas quis comentar aquela frase. Infelizmente ainda não vi a fita.
Cumprimentos.
a minha percepção foi diferente, é exactamente o facto de tudo aquilo ter sido mais ou menos assim, que torna o filme poderoso, qualquer ficção, na minha opinião pouco expecializada, deixar-me-ia mais indiferente ao filme.
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