27/11/07

Rua de sentido único

Procuro sentido: como quem diz, condoído. Lamento que, até ao momento presente, nenhuma luz consiga revelar, com a necessária nitidez, o contorno da morte. Nenhuma luz. Que é, como quem diz, sombra mergulhada na sombra, negro silencioso. Frio. A feliz percussão das palavras sobre o luminoso dia - os espaços entre as palavras, margens que distanciam a floresta bifurcada. No outro dia, percorri, durante os minutos que demorou uma viagem de autocarro, o tempo de uma vida. Os papéis acumulados de uma vida não chegavam a ser um acumular de inutilidades, perfeitas inutilidades - mas não sou dado a sentimentalismos. Pensei em perfeitas inutilidades como quem pensa na próxima refeição ou nos olhos da mulher que nos espreita. Perfeitas. Procurei sentido, comovido. Uma tabuleta indicava: rua com trânsito condicionado, entre tais e tais horas. Prometi a mim próprio que a essa, determinada, hora, ali regressaria. Passar naquela rua. Não cumpri. Perdi-me na sombra das horas cobrindo a distância entre os lugares por onde entretanto fui caminhando. Procurei sentido. Não encontrei o sentido dentro de mim.

[Sérgio Lavos]