De ano para ano, o verão cada vez mais entra pelo outono dentro. O calor prolonga-se, os dias quentes repetem-se, monótonos, e vai aumentando a vontade de chuva, de voltarmos a sentir a casa como refúgio das tempestades que vêm. O sentido das coisas depende da melancolia que o fim do verão faz nascer na alma. Sem essa ideia de fim, de passagem entre duas matérias, enredamo-nos na indecisão da natureza, e somos levados a crer que por uma vez os ciclos podem suspender-se e a necessária previsibilidade do tempo seja apenas uma ilusão. Neste meio termo, a luz nas praias torna-se mortiça, perde a nitidez e o brilho claro dos longos dias de verão. O calor é o mesmo, mas o corpo sente a diferença, a inclinação mais acentuada do sol sobre a pele. Quando por fim vier a primeira chuva, o alívio. Com ela, o mosto nos lagares crescendo, as laranjas nos pomares ganhando cor, os campos vazios esperando as sementeiras. Precisamos deste intervalo de tempo, entre o excesso e o desejo. A meio caminho de um ano.
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