Aquilo que terá levado Nas Nuvens até às nomeações para os Óscares - a consciência social, o interesse pelo espírito do tempo, no caso a crise económica - será o menos interessante no filme, principalmente porque Jason Reitman mostra pouca vontade de intervir na sociedade. O que terá convencido os membros da Academia de Hollywood foi antes a riqueza das personagens, o desempenho dos três actores nomeados para os Óscares (George Clooney, belíssima Vera Farmiga, excelente Anna Kendrick) e a inegável sagacidade que o realizador mostra na direcção de actores - confirmação do que foi mostrado em Juno - e ainda bem. Mas o filme vai um pouco mais longe, no modo como mostra os espaços vazios da modernidade, os não-lugares de que Marc Augé fala, pontos de passagem entre lugares - os aeroportos, os hotéis, os aviões. E, sobretudo, as empresas que dispensam funcionários e se vão esvaziando de vida, esses novos não-lugares criados pelo rebentamento das sucessivas bolhas de optimismo que o crescimento económico foi produzindo - a carga política do filme que realmente interessa. Neste ponto, há cenas exemplares - a sala com cadeiras vazias empilhadas onde Natalie espera, o escritório onde apenas resistem três ou quatro secretárias, e sobretudo a sequência do primeiro despedimento real remoto, que tem lugar, para cúmulo, em Detroit, uma das cidades americanas onde se sente mais intensamente o efeito da recessão americana. A montagem paralela, que vai mostrando o rosto de Ryan Bingham, Natalie e do homem que está a ser despedido, no ecrã e fora dele, e que acaba por estar na sala ao lado, a olhar para o monitor, é brilhante. A desumanização do capitalismo nunca terá sido tão bem filmada, e já se fizeram muitas obras panfletárias que podem comprovar a minha afirmação, podemos ter a certeza disso. Vale mais aquele plano, do desempregado a chorar no monitor que é espreitado por quem acabou de despedir do que qualquer manifesto de Michael Moore, por exemplo. O cinema como transcendência da realidade representada.
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