13/10/10

Para quê?

Além disso, para que impedir as pessoas de morrerem se a morte é o termo normal e legítimo para cada um de nós? Que importância tem que um mercador ou um funcionário quaisquer vivam mais cinco ou dez anos? Ora, se considerarmos que o objectivo da medicina consiste em aliviar com panaceias o sofrimento, surge involuntariamente uma pergunta: aliviá-lo para quê? Em primeiro lugar, dizem que o sofrimento leva o homem a atingir a perfeição; em segundo lugar, se a humanidade realmente aprender a aliviar o sofrimento com pastilhas e gotas, abandonará por completo a religião e a filosofia, nas quais tem encontrado até hoje não só protecção para todas as desgraças, como ainda felicidade. Púchkin, no seu leito de morte, passou por sofrimentos atrozes, o pobre do Heine esteve paralisado durante vários anos; por que não hão-de estar doentes um Andrei Efímitch ou uma Matriona Sávichna, cuja vida é fútil e seria completamente vazia como a da amiba, se não fosse o sofrimento? 

Anton Tchékhov, "A Enfermaria nº 6", incluído em Contos de Tchékhov, vol II, ed. Relógio d'Água, tradução de Nina Guerra e Filipe Guerra

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