07/03/10

Óscar

Bem, parece que é hoje, a grande festa do cinema - pode-se achar que Hollywood não é bem cinema, é outra coisa, mas digamos que os filmes não chegariam até nós sem a indústria americana. A História diz-nos que muitas vezes os bons filmes foram feitos contra a pressão dos produtores e são o resultado de lutas gloriosas dos realizadores para concretizarem a sua visão, e é uma pena que tantos esforços tenham acontecido em vão - obras inacabadas, amputadas - tantas vezes. O dinheiro que circula e alimenta a indústria tanto pode servir a anónimos tarefeiros como a génios que trabalham dentro do sistema. Olhando para os nomeados deste ano, temos James Cameron, que em meados dos anos 90 deixou-se de tretas (isto é, de realizar bons filmes de acção) e abraçou o demónio, cozinhando um bolo indigesto chamado Titanic que acabou por lhe trazer o Óscar - e agora prepara-se para repetir a dose, com alguma astúcia e muito desplante; mas também há Quentin Tarantino, o cinéfilo clubista, bulímico que se diverte à grande vasculhando no caixote de lixo da História do cinema, da série Z aos filmes de artes marciais, passando pelos peplums e o gore italianos; filmes de estreantes (Neil Blomkamp, Lee Daniels); filmes de filhos da indústria (Jason Reitman), de estilistas reconvertidos (Tom Ford); os geeks judeus do costume (os irmãos Cohen) e a primeira mulher a ter verdadeiras hipóteses de ganhar um Óscar de melhor realizador, Kathryn Bigelow. Há de tudo, para todos os gostos, num ano em que são dez, os nomeados para melhor filme (não acontecia desde os anos 40); e é bem provável que não ganhe o melhor dos nomeados - mas que interessa? Hitchcock nunca ganhou, Orson Welles também não, John Ford só teve quatro Óscares e David Lynch teve três nomeações e nunca levou o prémio para casa - no ano de Mulholland Drive, por exemplo, ganhou (gargalhada geral) Ron Howard por esse "belo" filme, Uma Mente Brilhante.
Um ano mais, portanto, em que o melhor filme, O Laço Branco, de Michael Haneke, apenas aparece na corrida para melhor filme estrangeiro - quantas vezes isto já aconteceu aos grandes realizadores europeus? Ainda assim, a festa tem de continuar, e de entre os nomeados, aqui vão aqueles que eu acho que deveriam ganhar - certamente, não os que a Academia vai escolher:

Melhor filme: Sacanas sem Lei. Mas muito perto, Nas Nuvens.
Melhor realizador: Quentin Tarantino.
Melhor actor: George Clooney (mas não vi nem Jeff Bridges nem Colin Firth).
Melhor actriz: que não seja nem Helen Mirren (não gosto do sobrevalorizado overacting, passe a redundância) nem Meryl Streep (humm... quem é esta?).
Melhor actor secundário: Cristoph Waltz (se não ganhar, enfim...).
Melhor actriz secundária: Anna Kendrick, ou Vera Farmiga, ou Anna Kendrick.
Isto e mais o prémio de melhor fotografia para Christian Berger (Laço Branco).
Sou capaz de ver a cerimónia, depois de muitos anos a achar que não valia a pena; cinema, amanhã talvez.

(Publicado em simultâneo no Arrastão)

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