11/11/06

Minudências

Era o blogue Noite Americana, julgo, que tinha como mote falar do acto de ir ao cinema, e não do filme em si, ou melhor, falar de um filme sem esquecer o que é verdadeiramente importante: a razão de estar ali, sentado no escuro da sala, a ver aquele filme e não outro, ter comprado bilhete penalizando o orçamento mensal em vez de estar em casa a tornar a inutilidade da vida menos fútil. (Como? Estudando, por exemplo). Louvável empresa, de resto, e na verdade nunca plenamente concretizada. Um blogue é um blogue é um blogue. Gosto de quem escreve A Noite Americana, e por isso agradar-me-ia que escrevessem mais vezes. Mas adiante.
As minudências, as envolvências de uma ida ao cinema. No meu caso, a impulsividade é a chave da decisão. Por razões profissionais, a sexta-feira costuma ser o dia em que atiro os dados sobre as páginas abertas do jornal, confiando num palpite que quase nunca bate certo, e arrisco duas horas da minha vida em frente ao teatro de sombras. Perdoem-me o lirismo tosco, mas a verdade é que, caso ainda não se tenha percebido, é realmente um prazer ver desfilar à minha frente as imagens que um dia alguém decidiu serem a realidade - o cinema é mais que um simulacro. Se não acreditar nisto pela via da razão, aposto tudo na fé. E, por norma, os deuses costumam intervir cá em baixo através do jogo dos acasos.
Retrocedendo um pouco: impulso; acaso. Primeiro, não faço o que devia fazer (e que prazer que é não fazer o que se devia fazer), segundo, hoje vou ao cinema, e não vou ver nem a Maria Antonieta nem a Senhora das Águas, apesar do apelo recalcitrante. Paris... qualquer coisa. King, visito a livraria que reabriu, para mal dos meus pecados (ver texto anterior), e compro o bilhete. Para a sessão tal e tal, o Paris qualquer coisa, aquele feito por não sei quantos realizadores sobre a cidade. A senhora pergunta: é este? Não, não é. Não era. Era o "Dans Paris", de que tinha visto um trailer que me desagradara, por me parecer exibir tiques do cinema francês de modo particularmente irritante. Que importa, deixemos o acaso trabalhar.
O filme, apesar dos tiques, é um charmoso exercício sobre o amor fraternal, e valeu a pena a sucessão de desvios a que fui sujeito até desembocar na sala errada. Talvez desenvolva noutra entrada algo mais substancial, talvez não. Um blogue é um blogue é um blogue.

[Sérgio Lavos]

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