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29/02/12

Carta do mensageiro

As minhas mãos não tocaram água desde que as tuas mãos,-
Não; - nem os meus lábios voltaram a libertar o riso desde o "adeus".
E, com o dia, a distância novamente
Interpõe-se entre nós, muda como uma concha desfeita.

Contudo, - muito se segue, muito perdura... confia apenas nos pássaros:
As asas de uma pomba fecharam-se sobre o meu coração a noite passada
Com uma suavidade urgente; e a pedra azul
Do anel da promessa tem brilhado desde então muito mais.

Hart Crane

In The Complete Poems of Hart Crane, ed. W. W. Norton & CO., 2001

18/10/11

A Casa é Infinita/Tomas Tranströmer

Primavera de 1827, Beethoven
iça a sua máscara da morte e parte.

As rodas continuam a girar nos moinhos da Europa.
Os gansos selvagens voam para Norte.

Aqui é o Norte, aqui é Estocolmo
piscinas apalaçadas e condomínios.

Os toros na lareira Real
desabam de Alerta! para À Vontade.

A paz prevalece, vacinas e batatas,
mas os poços da cidade respiram profundamente.

Pela noite, canhões são levados em segredo pela Ponte do Norte,
como se fossem paxás sentados em cadeirões de veludo.

O pavimento de pedra fá-los vacilar
donzelas mendigos cavalheiros.

Implacavelmente quieta, a placa
com o negro fumando.

Tantas ilhas, tanto para remar,
os invisíveis remos contra a corrente!

Os canais são transitáveis, Abril Maio
e o mês de Junho, doce e gotejante como mel.

O calor chega às ilhas mais distantes.
As portas na aldeia estão abertas; menos uma.

O ponteiro do relógio-cobra lambe o silêncio.
As encostas rochosas brilham com a paciência do geólogo.

Aconteceu assim, ou quase.
É uma obscura história de família

sobre Erik, derrotado por uma maldição,
inutilizado por uma bala disparada directo à alma.

Foi à cidade, encontrou um inimigo,
e regressou de barco, doente e cinza.

Fica de cama todo aquele verão.
As ferramentas na parede estão de luto.

Ele jaz acordado, ouve o esvoaçar felpudo
das mariposas, as suas companheiras ao luar.

A sua força esvai-se, tenta lutar em vão
contra a armadura de ferro, o amanhã.

E o Deus das profundezas grita das profundezas
"Entrega-te a mim! Entrega-te!"

Todo o movimento à superfície se volta para dentro.
Ele é despedaçado, recomposto.

O vento levanta e os arbustos
de rosas selvagens ondulam à luz fugidia.

O futuro floresce, ele olha
para o caleidoscópio auto-giratório

e vê trémulos e indistintos rostos,
rostos de familiares ainda por nascer.

Por engano, o seu olhar apanha-me
enquanto eu passeio aqui em Washington

por entre casas imponentes sustentadas
por colunas alternadas.

Prédios brancos que parecem crematórios,
onde o sonho dos pobres se transforma em cinza.

A suave encosta descendente torna-se mais íngreme
transformando-se subtilmente num abismo.


(Versão a partir da tradução de Robin Fulton para inglês, incluída no livro New an Collected Poems, ed. Bloodaxe Books.)

24/09/10

Arte poética

Escreve primeiro uma frase
E corta-a aos bocadinhos
Mistura-os e deixa-os ficar
do modo que vão cair
Não tem qualquer importância
A ordem que daí resultar.

Lewis Carroll

27/11/09

O som das árvores

Penso em árvores.
Por que, do lugar onde vivemos,
Preferimos ouvir
O som que elas fazem a
Qualquer outro?
Constantes, suportamo-las
Até perdermos o sentido de ritmo
E nos distraímos dos nossos prazeres imutáveis,
E lhes damos atenção.
Elas são como alguém que fala
Em partir mas nunca o faz.
E continua a falar, mesmo
Envelhecendo, ficando mais sábio,
Agora é que vai mesmo ficar.
Por vezes, os pés batem no chão,
E a cabeça balouça quando,
Da janela ou encostado à porta,
Vejo as árvores balouçar.
Partirei para longe,
Tomarei a ousada decisão,
Um dia, enquanto elas levantam a voz
E se agitam, alarmando as brancas nuvens
Por cima.
Falo menos,
Mas partirei.

Robert Frost, incluído em A Poet's Guide to Britain, ed. Penguin

traduzido por

05/11/08

Um sonho adiado

O que acontecerá a um sonho adiado?
Será que definha
como uma uva ao sol?
Ou purula como uma ferida
e depois desaparece?
Será que cheira a carne apodrecida?
Ou se cristaliza e adoça
como um caramelo?
Talvez apenas vergue
como o faz um pesado fardo.

Ou será que explode?

Um poema de Langston Hughes

versão de

[Sérgio Lavos]

22/10/08

A banheira

Como uma banheira de porcelana branca
Quando a água quente arrefece e se evapora,
Assim é o lento desvanecer da nossa tempestuosa paixão,
Ó minha mui louvada mas-não-especialmente-satisfatória senhora.

Ezra Pound

versão de

[Sérgio Lavos]

21/06/07

Linhas para um velho

O tigre no seu covil
Não é mais irritável do que eu.
A cauda chicote não está mais quieta
Do que quando eu farejo o inimigo
A contorcer-se no sangue essencial
Ou balançando-se da segura árvore.
Quando revelo os dentes do escárnio
O sibilar da língua bífida
É mais caloroso que o ódio,
Mais amargo que o amor que se tem à juventude -
E inacessível aos jovens.
Reflectido no meu olho dourado,
o velho do restelo torna-se um louco.

Digam-me se não devo rejubilar!

T. S. Eliot

versão de

[Sérgio Lavos]

23/05/07

Meditatio

Quando penso com atenção nos curiosos hábitos dos cães
Inclino-me a achar
Que o Homem é o animal superior.

Quando penso nos curiosos hábitos do Homem,
Meu amigo, confesso, fico baralhado.

Ezra Pound


(versão de)

[Sérgio Lavos]

18/05/07

Paisagem com queda de Ícaro

De acordo com Brueghel
quando Ícaro caiu
era primavera

um agricultor lavrava
o campo
todo o esplendor

do ano acordara
e crepitava
à

beira-mar
preocupado
consigo mesmo

suando ao sol
que derretia
a cera das asas

acidentalmente
ao largo da costa
aconteceu

um mergulho surdo
era
Ícaro que se afogava

William Carlos Williams

(versão de )

[Sérgio Lavos]