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29/07/09

Será humano ou dançarino?

Em todo este miserável caso do crítico censurado em público por uma das suas chefias, o que me deixou verdadeiramente surpreendido - não me surpreenderam os 200 comentários indignados nem a carta da direcção do Belenenses, porque a ignorância exige sempre os seus direitos, neste caso o direito a existir - foi o sub-director que decidiu escrever em editorial contra um dos seus, por uma questão de pormenor, ou pior, de estilo. João Bonifácio é, actualmente, e assumo a subjectividade desta afirmação, o melhor crítico musical (na área do pop-rock) a escrever em jornais nacionais (esquecendo João Lisboa); tem um estilo original, e assume essa originalidade sem preconceitos, e isto por cá é raríssimo (o principal problema) - mas ele lê, e bem, o que os críticos estrangeiros fazem, e decidiu seguir o bom exemplo. Já não é a primeira vez que esta originalidade provoca polémica - da primeira, não passou dos blogues, mas ele lá teve de vir explicar, falar daquele lugar-comum de que escrever sobre música é como dançar sobre a arquitectura. A partir deste ponto de subjectividade absoluta, tudo deveria ser permitido, e não me parece que não vivamos numa sociedade que defenda a liberdade de expressão. Mas Nuno Pacheco, contrariando a ideia que eu tinha dele - como sendo o sub-director mais lúcido do Público - cede à chantagem de um clube de futebol e, vamos lá ver qual é o termo técnico, baixa as calcinhas pedindo perdão ao Belenenses e às centenas (???) de leitores indignados com o bruto do crítico. Um texto crítico, de opinião, que me fez rir logo na abertura, com a aquela referência ao deserto que é o estádio do Restelo - e se querem verdade e dignidade, o estádio do Restelo é mesmo um deserto em dias de bola, uma tristeza de espectáculo que deveria envergonhar os dirigentes do clube - um texto bem escrito que mereceu a censura sem ter sido sequer referido - falta de educação - o nome do crítico em questão - Nuno Pacheco fala apenas de um colega. Como muito bem escreve o Luís Miguel Oliveira, "ofender muçulmanos está bem, ofender o Belenenses é que não?" Palavras para quê, é um artista português.
Sou bem capaz de começar a comprar apenas o I. E isto não é uma ameaça.

08/06/09

O espectáculo das eleições

A impossibilidade de olharmos para qualquer acontecimento exterior de modo inocente torna inevitável a construção de uma narrativa. Mas quando entre nós e o mundo se interpõe uma barreira, o conhecimento passa a ser ilusório, puro engano dos sentidos. Se essa barreira, mais do que ser opaca, é um espelho que distorce a realidade, quanto daquilo que vemos é passível de ser real?
O problema não é aceitarmos a inevitabilidade desta verdade, mas saber até que ponto é mais útil não saber nada do que se passa fora dos limites daquilo que não controlamos.
Olhando para a cobertura mediática da noite eleitoral, apercebemo-nos das narrativas que as televisões vão construindo. Da expectativa anterior às primeiras sondagens à boca da urna, prevendo um resultado num determinado sentido, até aos resultados definitivos, um longo caminho foi percorrido. Os comentadores, analistas, comendadores de serviço, debitaram quilómetros de opiniões, especulações, num festivo bombardeamento dos sentidos. Cada nova informação contribuía para que o espectador se afastasse mais da realidade. Dos erros das sondagens à surpresa da derrota, tudo parece ter sido preparado para que um grande espectáculo fosse assistido pelo maior número possível de pessoas. As marcas de uma obra de ficção estão à vista de todos: o suspense do fecho das urnas, os primeiros resultados, a expectativa sobre uma sondagem para as legislativas, os numerosos directos das sedes dos partidos com jornalistas ampliando os minutos de espera dos derrotados em marcação cerrada e mantendo a emissão numa euforia expectante enquanto os vencedores não entram. O mistério - políticos que abandonam as sedes partidárias -; o melodrama - políticos que choram no enfrentar das adversidades; a comédia - juventudes partidárias em encenadas celebrações; os diversos climaxes - o discurso de vitória, dedos no ar e punhos em riste, as pausas para que o público se manifeste. Indícios de um grande espectáculo, do outro lado do ecrã, para uma audiência de milhões. As narrativas que daqui saem mostram as sedes dos partidos vencedores cheias e eufóricas e as salas vazias dos vencidos depois do esvaziar da festa.
Depois de tudo ter terminado, resta aos jornalistas mais uma previsão, o preparar do terreno para a próxima perfomance do grande circo da política. Análises balofas, adivinhações, truques de ilusionismo que escondem derrotas, sobrevalorizações de resultados esperando mais vitórias.
E nós, do lado de cá do espelho, o que poderemos fazer para além de aceitar a realidade que nos oferecem?

31/12/08

O fim do mundo em directo (lá para 2009)

Hoje, na última página do Público, Miguel Gaspar reflecte sobre o fim do mundo; nada de importante, ele tem razão: acabou quatro vezes este ano, se não mais. Ora é a subida vertiginosa do preço do petróleo, ora é a ameaça nuclear iraniana, ora é um ou outro atentado terrorista, a crise financeira, a derrocada económica... há incontáveis razões para pôr as mãos à cabeça. O que Miguel Gaspar não faz é dar o remate apropriado ao texto: para os media, estes têm sido tempos de festividade contínua. Os jornais analisam, as televisões gritam, os blogues alarmam, até à exaustão. Os canais de notícias, de hora a hora, repetem os augúrios de catástrofe, e em resposta os mercados entram mesmo em pânico, e as economias deprimem-se, e o mundo ocidental descarrila, como num mau filme de Hollywood. 

A verdadeira notícia deste ano, conclusão alarmante de um período crescente de histerismo mediático, é que bastam os boatos dos jornalistas e as previsões dos analistas para as coisas acontecerem. O hipermediatismo actual leva a que tudo se saiba a toda a hora, e numa sociedade dominada por uma economia liberal que se funda em bens virtuais, em dinheiro potencial, basta a mais ínfima centelha de pânico para espoletar um incêndio incontrolável. 

Quando a crise financeira rebentou, as televisões começavam de manhã a especular sobre a queda das boslas, continuavam ao longo do dia noticiando a queda das bolsas (espectacular Nostradamus) e finalizavam o dia aguardando ansiosamente o dia seguinte, que ainda seria pior que o anterior; o caos a qualquer momento podia se instalar, o fim do mundo parecia estar perto. Mas, milagre, umas quantas empresas faliram, o que até parece ser um facto normal nas sociedades capitalistas, e tudo passou, até que começaram a aparecer os rumores da crise económica (verdadeiros cavaleiros do Apocalipse), precedendo a real crise económica. O ciclo regular da economia parece que foi tomado pelo medo, de forma estranhamente parecida ao que acontece com o terrorismo; cada previsão económica dos analistas dos media destila o receio sobre o que virá. Pessimistas ganham espaço nas colunas dos jornais e tempo de antena na televisão, perorando infinitamente sobre a podridão do mundo actual e suspirando sobre um tempo mítico que na realidade nunca terá existido.

Convém não fecharmos os olhos aos indícios (o misticismo apocalíptico é o maná dos nossos dias). Tudo pode terminar? Claro, eventualmente, não é isso que está em causa. Mas mais depressa terminará a imprensa tal como a conhecemos, e se indícios existem, é disso mesmo; a imparável tabloidização de todos os meios de comunicação é um sintoma do fim de uma era, a que não será, de todo, alheio, o surgimento dos blogues e do do it yourself, essência da Web 2.0. 

O mundo é que não deixará de existir se não for notícia.

[Sérgio Lavos

14/09/08

América


Passamos mais tempo a ver imagens da América do que do nosso país. Suponho que será a isto que chamam globalização cultural, por isso mais vale aceitar as consequências.
O burburinho que se tem vindo a cristalizar em torno das eleições americanas é desta vez mais audível. Tropeçamos diariamente nos especialistas em política e cultura norte-americanas; parece que toda a gente tirou uma licenciatura em Relações Internacionais com tese escrita sobre a América. Não há, na essência, nada de errado nisto. As coisas acontecem, estão aí a acontecer, esvoaçam à nossa volta, e se tivermos uma rede perto, é de aproveitar, capturemo-las. É para isso que os jornais pagam e os blogues não. 
Mas a milhares de quilómetros de distância, saberemos nós mais que os americanos que irão votar? O que é uma opinião, quanto vale? Que interessa o fulgor de Obama, ou a armadilha de Palin? Tudo bem, falamos do nosso futuro, quando discutimos as eleições americanas. O que impressiona não é esta vontade de ter uma opinião sobre tudo (admito que neste momento estou a fazer exactamente o mesmo); é a certeza com que se estranha o apelo da candidata a vice-presidente americana ou o esforço que se faz para tentar compreender por que razão Obama continua a ser incompreendido para, lamento, a maioria da população americana.
A América profunda que se apaixona por uma dona-de-casa que adora armas ("chicks with guns") e ama a vida não se compadece com os receios de uns quantos europeus; vota com o coração, que é o mesmo que dizer que vota em valores que ultrapassam a razão. A América que eu conheço não será diferente daquela que a maioria opinadora conhece: a América mediada pela televisão e pelo cinema, uma América idealizada ou estereotipada, mas que, apesar de tudo, escolhendo as imagens certas, se aproxima das representações que dela fazem.
Seria sensato rever, por exemplo, Twin Peaks, que neste momento repete no canal FX, e aprender com o olhar cirúrgico de David Lynch a conhecer a América que votará McCain por causa de Sarah Palin. Imagino eu, claro, que nunca lá estive. Mas é tão fácil cair na ilusão de saber algo se tivermos as imagens certas.

[Sérgio Lavos

09/09/08

José Vítor Malheiros

Não sei o que possa ser um bom cronista - procurei no dicionário a entrada correspondente e deu em nada. Mas leio nos jornais tanta coisa decorada por uma fotografia mais ou menos debotada do seu autor, que alguma coisa deverei ter aprendido sobre o assunto. Na verdade, compro jornais quase só pelos artigos de opinião e as reportagens; e enquanto que os primeiros abundam, espalhando mediocridade opinativa pelas ruas do país, as segundas começam a escassear, dizem que por razões de economia. Lá saberão os directores dos jornais, e eu não quero perceber por que razão é mais fácil vender o que a concorrência - televisão e internet - também oferece: notícias. Que os bons jornais lá de fora cada vez mais apostem em artigos de fundo não poderá ser apenas coincidência - o Público chegou a publicar há uns tempos um artigo com uma entrevista a um guru dos media que defende ser o esse o futuro, um regresso em força ao novo jornalismo ao estilo da New Yorker e do movimento com o mesmo nome que surgiu nos EUA nos anos cinquenta. Mas o risco deve ser grande - não se vê nenhuma mudança neste sentido.
Enquanto isto, vou lendo as escassas vozes, e entre elas uma tão discreta quanto certeira e clara: José Vítor Malheiros. A sua coluna de hoje, dedicada aos ritmos do tempo moderno, é um exemplo. O estilo, entre o cínico e o sério, cativa desde o primeiro parágrafo; o texto começa por ser sobre as mudanças que vão ocorrendo na sociedade de hoje, e sem darmos por isso vai construindo a sua argumentação de forma subtil, até culminar na sua essência secreta: o silêncio; de Manuela Ferreira Leite, quem mais? Nem me tinha dado conta de que entráramos em território da política; são assim os bons escritores: lançam o laço no momento mais imprevisto. O parágrafo final, apenas para que se prove o que afirmo:

A democracia deve ser também o conhecimento destas tarefas, do ritmo e dos objectivos do trabalho político, porque ele deve ser transparente e possuir uma racionalidade evidente, cujos resultados se inscrevam com sentido na nossa vida. A inexistência desse sentido é um sinal de que a democracia está colada com cuspo. Mas é também um reflexo de uma incompetência dos políticos. Dar visibilidade e racionalidade ao seu trabalho é uma das tarefas de qualquer político. É por isso que a afasia do PSD, o silêncio de Manuela Ferreira Leite ou a banalidade do seu discurso quando finalmente fala é tão lesivo da democracia como as práticas de que acusa com razão governo.

Ninguém disse sobre o não-acontecimento da rentrée social-democrata nada tão sensato e incisivo. Apenas isto. Isto, apenas.

[Sérgio Lavos]

10/10/07

Problema de expressão

De certeza que não há qualquer ligação: mas não é que José Rodrigues dos Santos, que anda num queixa-não queixa, sofre-não sofre pressões do governo na sua (primeira) profissão, e apareceu em dois dias seguidos nos dois principais jornais nacionais, vai lançar ainda este mês o seu próximo (e bombástico) best-seller? Não lhe chega aparecer todos os dias nos ecrãs de televisão? Afinal, o que tem ele a dizer que não se saiba já?

[Sérgio Lavos]

11/03/06

Speaker's Corner

Ontem, zappando quase insone e debatendo-me com uma digestão difícil e a doença passageira do meu filho, deparei-me com um programa na RTP-N, "Choque Ideológico", onde se mostravam Ivan Nunes e Helena Matos, debitando os discursos formatados de uma certa esquerda e de uma certa direita, tudo muito ameno, tudo muito controlado, sem grandes ondas. Apercebi-me depois que são ambos bloggers. O primeiro mantém o interessante A Praia, a segunda é uma recém-chegada ao ninho de extremistas ditos liberais, o blogue Blasfémias. Esta progressiva promiscuidade entre blogues e media tradicionais limita-se a provar uma coisa: quem domina a opinião em Portugal, com a emergência da blogosfera ganhou um poleiro mais. Diversidade, dizem? Vontade de poder, antes escrevemos. O salto é curto, e depressa nos habituamos a ler uns e outros nos sítios do costume. A democracia é isto. Apenas Pacheco Pereira paira acima de tudo, manejando com diligente oportunismo os cordelinhos dos diversos palanques controlados. A suas leis da blogosfera são paradigma daquilo que afirmo. Semelhante desfaçatez faria qualquer outro corar de vergonha. Mas enfim, nem vale a pena a preocupação. Voltando ao mundo real...

[Sérgio Lavos]