30/05/08

Berlim (excertos) #5

Foto: Sérgio Lavos

É uma daquelas verdades que se tornam reais quando por elas passamos: em Berlim, a história susteve o seu impulso durante algum tempo, deixando marcas nos edifícios, nas ruas, sobretudo nas pessoas.
Não são só apenas os museus ou os monumentos; ao caminhar na rua, podemos deparar com um sinal de outro tempo, uma placa de metal incrustada no passeio, em frente a uma casa, assinalando a vida de um judeu proeminente que terá ali vivido e que acabou morto num campo de concentração. Duas linhas paralelas atravessam grande parte da cidade, duas linhas irregulares que avançam pelos passeios, pelas ruas, cruzando jardins e parques, duas linhas dolorosas que são como uma cicatriz no tecido urbano - o vestígio que resta do Muro de Berlim. Ninguém poderá escapar à tragédia. Para um turista ela tem um significado apenas pitoresco, para um imigrante nada pode significar; mas um berlinense dificilmente escapará aos ecos que se repercutem no presente. O rigor alemão e o amor à ordem, que poderão ter conduzido o país no passado a becos sem saída, transformaram a cidade de Berlim num gigantesco memorial, numa memória viva - oitenta por cento da cidade foi erigida depois da destruição da Segunda Guerra Mundial, e existem áreas da cidade que não têm mais de quinze anos, edificadas depois da queda do Muro.
A cidade é simultaneamente passado e presente, memória do caos e presença viva da ordem; a geometria regular repete a cidade de outros tempos, provando que o espírito de um povo é imutável. A linguagem da técnica pode conduzir ao horror mas também sobreleva aquilo que de melhor tem o ser humano; o equilíbrio precário manter-se-à até quando?

[Sérgio Lavos]

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