21/02/12

Pensamento mutilado

Reflexão interessante de José Gil - o seu texto vai muito além da argumentação mais comum contra o novo AO. O Acordo não "mutila o pensamento", simplesmente o transforma. A questão é, e será sempre: a língua terá de ser regida por um Acordo, seja o de agora, seja o de 1911, seja o do latim escrito das classes altas de Roma Antiga. E pensamos de acordo com o acordo que usamos. Mas será um melhor do que o outro? Heidegger achava que o pensamento nunca teria atingido patamares tão elevados como na Grécia Antiga, precisamente por causa da língua que os filósofos e os poetas da época falavam. Maior complexidade gramatical permite uma maior amplitude do pensamento. Difícil discordar. Mas com o AO não são as regras gramaticais que mudam, mas sim a grafia. Será preciso mais do que uma profissão de fé para se provar que a língua ficará mais pobre com a mudança. E precisamente porque os grandes escritores infrigem e ultrapassam as regras da língua que usam, "quando o espaço virtual de liberdade interna da língua se solta e ousa, para além do uso rotineiro e correcto da gramática", é que o AO não "mutila o pensamento". Um criador precisa de regras para as poder quebrar, torcer, manipular. Para descobrir uma nova linguagem, um outro pensamento. Um Acordo é como se fosse um obstáculo que se evita, apenas para se descobrir um caminho escondido. Seja este ou outro, em qualquer tempo.


(Também no Arrastão.)

Sem comentários: