31/10/07

5 letras, 5 filmes

Ora bem, cinco filmes da minha vida, caro Solvstag? Um clássico, que já deve ter dado a volta ao mundo dos blogues centenas de vezes. Como até ando bem disposto, vou acrescentar alguma dificuldade à corrente. E que tal cinco filmes começados pelas letras do meu apelido, em inglês? Portanto um filme começado por L:

Lost Highway, de David Lynch - não é o meu preferido dele, mas Lavos não contém um M. Se Tivesse de dizer apenas uma razão para estar nesta lista, é o facto de, passados 10 anos, muitos visionamentos e alguns textos teóricos depois, ainda não ter entendido a totalidade do filme. Há pistas, claro, e quase que percebo por que razão o Mistery Man aparece em dois lugares ao mesmo tempo. Não é isso o mais importante, de resto. A ideia dos duplos estabelecendo pontos de contacto entre tempos e camadas de consciência é apenas um pretexto. Acima de tudo, a elegante esquizofrenia do desejo masculino. Soberbo.

Apocalypse Now, de Francis Ford Copolla: o melhor do bando à parte do cinema americano dos anos 70 (com milhas de avanço em relação a Scorcese) realizou aquele será, durante os séculos vindouros, o melhor filme de guerra de sempre (logo assim, à distância). E o problema para a concorrência é que o filme nem sequer é de guerra - majestática ópera sobre a natureza humana (as Valquírias não estão lá por acaso).

Vertigo, de Alfred Hitchcock: cada mulher sublima-se e perde a sua individualidade, na cabeça de um homem. Na cabeça de um homem, todas as mulheres são uma mulher só. E cada mulher repete-se em cada nova mulher que se ama. Misoginia? Uma condenação, uma miserável deficiência ditada pelo gene Y que partilhamos. E Madeleine/Kim Novak (a Scarlett Johansson de Hitchcock) sabe tudo, desde o início. Trágico destino da inferior raça masculina, o engano.

On The Waterfront, de Elia Kazan: podia ter aqui a primeira parte do Padrinho, só para falar da cena da morte de Don Vito Corleone e da improvisação do outro mundo de Marlon Brando. Mas como tem de ser um filme começado por "O" (e podia ser também "On Connait la Chanson" ou "One Flew Over the Cuckoo's Nest"), falo do gingar e do rodopiar do estivador Brando em volta da loura pálida Eva Marie-Saint, na rua, a caminho da imortalidade. Assentemos nisto: James Dean era um menino chorão que deitou fora cedo de mais o pouco talento que tinha. Marlon Brando era grande. Enorme. Maior do que alguma vez o seu ego aguentou - e sempre sem fazer caso disso, em esforço. O Maradona da representação.


Some Like it Hot, de Billy Wilder: já vi vezes suficentes este filme para conhecer todas as cenas de cor e ter deixado de lhes achar piada. Mas isso não aconteceu ainda. A melhor comédia de sempre (para alguns - eu diria que está a par de "Monty Python e o Cálice Sagrado") continua tão eficaz como da primeira vez. E claro, Marilyn Monroe mostra que consegue mais do que ser, simplesmente, o arquétipo da espécie. Sabe representar. Gozar com a imagem que o mundo tem de si. A mão de Wilder seria certeira mais vezes; mas nunca com o estado de graça deste filme. Há alguns que conseguem ser perfeitos.

Passo o desafio ao Pedro Mexia, ao Luís Miguel Oliveira, ao Alexandre Andrade, ao Ivan Nunes e ao João Lopes, porque são eles quem melhor escreve sobre cinema na blogosfera e também porque, por esta mesma razão, não se vão dar ao trabalho de continuar a corrente. Sete anos seguidos de maus filmes, é o que dizem. Azar.

(Reparo que Brando aparece duas vezes; aparecem duas louras de Hitchcock; uma loura/morena que emula as mulheres de Hitchcock; e o ideal de beleza feminina, a falsa loura Norma Jean. Que padrão é este que detecto?)


[Sérgio Lavos]

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