
[Susana Viegas]
 Não acho que "O Bom Alemão" seja um anacronismo. Para além de o filme ser um exercício de estilo de um cinéfilo, é principalmente um filme pós-moderno, com todas as marcas de uma época em que a recriação e a citação são valorizadas a um expoente máximo. Há outros exemplos no cinema, o mais conhecido é o "Psico" de Gus van Sant. Neste caso, a homenagem a Hitchcock serve-se fria, feita de uma ironia e subversão que, de resto, já não estavam de todo ausentes do original filmado a preto-e-branco. O camp é sempre um objectivo para van Sant - e colorindo a película, o filme chega lá.
Não acho que "O Bom Alemão" seja um anacronismo. Para além de o filme ser um exercício de estilo de um cinéfilo, é principalmente um filme pós-moderno, com todas as marcas de uma época em que a recriação e a citação são valorizadas a um expoente máximo. Há outros exemplos no cinema, o mais conhecido é o "Psico" de Gus van Sant. Neste caso, a homenagem a Hitchcock serve-se fria, feita de uma ironia e subversão que, de resto, já não estavam de todo ausentes do original filmado a preto-e-branco. O camp é sempre um objectivo para van Sant - e colorindo a película, o filme chega lá."Song to the Siren"
On the floating, shapeless oceans
I did all my best to smile
til your singing eyes and fingers
drew me loving into your eyes.
And you sang "Sail to me, sail to me;
Let me enfold you."
Here I am, here I am waiting to hold you.
Did I dream you dreamed about me?
Were you here when I was full sail?
Now my foolish boat is leaning, broken love lost on your rocks.
For you sang, "Touch me not, touch me not, come back tomorrow."
Oh my heart, oh my heart shies from the sorrow.
I'm as puzzled as a newborn child.
I'm as riddled as the tide.
Should I stand amid the breakers?
Or shall I lie with death my bride?
Hear me sing: "Swim to me, swim to me, let me enfold you."
"Here I am. Here I am, waiting to hold you."
 Ainda a propósito de "Diário de um Escândalo", lembrei-me de uns textos escritos por Pedro Mexia no seu anterior blogue Fora do Mundo, em que ele fazia a apologia do gosto por ninfetas. É um risco defender tais coisas num tempo de severa perseguição a quem se atreva sequer a imaginar que uma rapariga de quinze anos possa ter alguns atractivos de ordem sexual. As confusões entre pedofilia, pederastia, crime e inclinação sexual, assim como a mistura entre moral privada e pública e verdadeiro crime, fazem com que, por exemplo, há alguns anos atrás uma professora norte-americana tenha sido condenada a alguns anos de prisão por ter mantido uma relação com um aluno, com quem aliás veio depois a casar. O que, sem dúvida, na altura me fez sorrir quase na mesma medida com que me indignei com o caso. A questão é: onde acaba a diferença sexual e começa o crime? A linha tem de ser traçada. As sociedades ocidentais definem uma idade, 16 ou 18 anos, mas a verdade é que as únicas razões que sustentam este limite são de natureza cultural. O que deveria ser tomado em linha de conta, o consentimento dos dois (ou mais) parceiros, é apenas uma desnecessária abstracção, tanto para a moral colectiva como para os legisladores. No filme de que falo, a professora nunca se sente arrependida do que fez, apenas se sente constrangida pela inevitável perseguição que os media lhe movem, pelas pressões da sociedade a que pertence. Quando, a determinada altura, a mãe do adolescente irrompe pela casa de Sheba dentro, agredindo-a e insultando-a, o que está verdadeiramente em causa não é a natureza do acto da professora - consentido pelo adolescente (as condicionantes da sexualidade masculina não permitem que seja de outro modo); é a condenação do contexto libertário da atitude de Sheba. É a imposição de um modelo moral ao resto do grupo, assim como uma reacção de natureza psicanalítica; a mãe reage de forma violenta porque sente que o filho lhe escapa, sente que o complexo de Édipo é naquele momento apenas uma memória distante; sente que perdeu o filho para outra mulher.
Ainda a propósito de "Diário de um Escândalo", lembrei-me de uns textos escritos por Pedro Mexia no seu anterior blogue Fora do Mundo, em que ele fazia a apologia do gosto por ninfetas. É um risco defender tais coisas num tempo de severa perseguição a quem se atreva sequer a imaginar que uma rapariga de quinze anos possa ter alguns atractivos de ordem sexual. As confusões entre pedofilia, pederastia, crime e inclinação sexual, assim como a mistura entre moral privada e pública e verdadeiro crime, fazem com que, por exemplo, há alguns anos atrás uma professora norte-americana tenha sido condenada a alguns anos de prisão por ter mantido uma relação com um aluno, com quem aliás veio depois a casar. O que, sem dúvida, na altura me fez sorrir quase na mesma medida com que me indignei com o caso. A questão é: onde acaba a diferença sexual e começa o crime? A linha tem de ser traçada. As sociedades ocidentais definem uma idade, 16 ou 18 anos, mas a verdade é que as únicas razões que sustentam este limite são de natureza cultural. O que deveria ser tomado em linha de conta, o consentimento dos dois (ou mais) parceiros, é apenas uma desnecessária abstracção, tanto para a moral colectiva como para os legisladores. No filme de que falo, a professora nunca se sente arrependida do que fez, apenas se sente constrangida pela inevitável perseguição que os media lhe movem, pelas pressões da sociedade a que pertence. Quando, a determinada altura, a mãe do adolescente irrompe pela casa de Sheba dentro, agredindo-a e insultando-a, o que está verdadeiramente em causa não é a natureza do acto da professora - consentido pelo adolescente (as condicionantes da sexualidade masculina não permitem que seja de outro modo); é a condenação do contexto libertário da atitude de Sheba. É a imposição de um modelo moral ao resto do grupo, assim como uma reacção de natureza psicanalítica; a mãe reage de forma violenta porque sente que o filho lhe escapa, sente que o complexo de Édipo é naquele momento apenas uma memória distante; sente que perdeu o filho para outra mulher. A tocar na barra lateral, os !!! (toda a gente sabe como se pronuncia), com uma faixa do último álbum, "Myth Takes".
A tocar na barra lateral, os !!! (toda a gente sabe como se pronuncia), com uma faixa do último álbum, "Myth Takes". Por vezes, há filmes menos bons, filmes cujas fraquezas não deixam que os pontos fortes acabem por resistir à avaliação totalitária do objecto. Um verdadeiro mau filme não persiste por mais do que algumas horas, aquelas que perdemos a pensar em que outra actividade poderíamos ter gasto o dinheiro do bilhete. Ou os minutos que gastamos a resumir às pessoas que conhecemos a história enquanto criticamos tudo o que é obrigatório criticar. Mas claro, há sempre ideias brilhantes clamorosamente mal trabalhadas. Grandes filmes falhados. Por uma ou outra razão.
Por vezes, há filmes menos bons, filmes cujas fraquezas não deixam que os pontos fortes acabem por resistir à avaliação totalitária do objecto. Um verdadeiro mau filme não persiste por mais do que algumas horas, aquelas que perdemos a pensar em que outra actividade poderíamos ter gasto o dinheiro do bilhete. Ou os minutos que gastamos a resumir às pessoas que conhecemos a história enquanto criticamos tudo o que é obrigatório criticar. Mas claro, há sempre ideias brilhantes clamorosamente mal trabalhadas. Grandes filmes falhados. Por uma ou outra razão.
 As notícias sobre a excelência do último filme de Clint Eastwood, "Cartas de Iwo Jima", terão sido exageradas. A unanimidade dos críticos portugueses é um acontecimento raro (quem se lembra da última vez que sucedeu o fenómeno?), apesar de, ultimamente, Eastwood se ter transformado no realizador americano a adorar - repete-se o lugar-comum do último dos clássicos. Senti-me impelido (empurrado?), apesar da escassez do tempo em mãos - quem disse que a crítica não é um exercício de publicidade indirecta? Não me interessa saber se o crítico é ou não elitista; Luís Miguel Oliveira, Bruno Sena Martins e Alexandre Andrade têm discorrido sobre o tema com mais ou menos acerto. De resto, o maior blockbuster de sempre, "Titanic", que eu me lembre também conseguiu um estranho consenso crítico na época. Não percebo o que é ser elitista no exercício da crítica, mas entendo o elitismo no gosto. Apenas preferia ver outro termo utilizado: exigência. De quem vê e de quem faz. O criador deve esperar que a leitura feita da obra criada ultrapasse as suas próprias expectativas; a interpretação não acaba na sala de montagem, continua no espírito de cada espectador. E este deve exigir que a obra coloque problemas, deve desejar que não lhe seja tudo oferecido de bandeja. Elitismo é uma etiqueta colada por quem não espera nada de um filme a quem acha que o exercício da crítica exige uma independência em relação à opinião de quem pouco exige do cinema. De tanto malabarismo argumentativo, acabo por me aproximar da conhecida resposta de João César Monteiro a um jornalista, à saída da sua "Branca de Neve". Quem emite uma opinião sobre um filme - não passa disso mesmo, opinião - deveria ter em mente a frase de César Monteiro.
As notícias sobre a excelência do último filme de Clint Eastwood, "Cartas de Iwo Jima", terão sido exageradas. A unanimidade dos críticos portugueses é um acontecimento raro (quem se lembra da última vez que sucedeu o fenómeno?), apesar de, ultimamente, Eastwood se ter transformado no realizador americano a adorar - repete-se o lugar-comum do último dos clássicos. Senti-me impelido (empurrado?), apesar da escassez do tempo em mãos - quem disse que a crítica não é um exercício de publicidade indirecta? Não me interessa saber se o crítico é ou não elitista; Luís Miguel Oliveira, Bruno Sena Martins e Alexandre Andrade têm discorrido sobre o tema com mais ou menos acerto. De resto, o maior blockbuster de sempre, "Titanic", que eu me lembre também conseguiu um estranho consenso crítico na época. Não percebo o que é ser elitista no exercício da crítica, mas entendo o elitismo no gosto. Apenas preferia ver outro termo utilizado: exigência. De quem vê e de quem faz. O criador deve esperar que a leitura feita da obra criada ultrapasse as suas próprias expectativas; a interpretação não acaba na sala de montagem, continua no espírito de cada espectador. E este deve exigir que a obra coloque problemas, deve desejar que não lhe seja tudo oferecido de bandeja. Elitismo é uma etiqueta colada por quem não espera nada de um filme a quem acha que o exercício da crítica exige uma independência em relação à opinião de quem pouco exige do cinema. De tanto malabarismo argumentativo, acabo por me aproximar da conhecida resposta de João César Monteiro a um jornalista, à saída da sua "Branca de Neve". Quem emite uma opinião sobre um filme - não passa disso mesmo, opinião - deveria ter em mente a frase de César Monteiro.