Na frente da casa eu convido quem queira entrar
nesses corredores onde despeço
o tempo e acomodo os tentáculos do esquecimento.
Em breve, da tua vida restará apenas um diário
deixado sobre a arca de mogno escuro
que num Verão antigo transportaram para o sótão.
Nesse diário vivem rostos, e árvores, e amor,
mas as letras que desenham tais inutilidades
começam a sumir – na sombra do sótão, não existem já.
no teu coração as criaturas do espírito que te levava
pela mão, do caminho da escola à ladeira que circundava
o muro mais longínquo da casa. Louro bravo
dançava com as sombras da figueira carregada
de Setembro – o figo, escrito no papel,
tocava os lábios como um verso doce
que te adormecia à noite. Na coroa aberta
do figo dançavam a língua e as palavras que a cobriam.
Tempo de certeza. O voo misterioso da andorinha
tinha o seu regresso marcado – todos os anos
o ninho estava à espera. O ritmo das estações,
exato e pleno, adormecia-te quando o temor rondava.
E ajudo a morte, ajudo, fecho as janelas de casa
sabendo que nunca mais as vou abrir.
Agora o conjunto de folhas é uma ruína fria na luz apagada da manhã.