Na continuação da procura de um sentido nos filmes de David Lynch, retiro um excerto da entrevista publicada no Expresso (realizada em Setembro de 2006) onde podemos compreender a inversão estética em causa: não se trata da valorização do feio como horrível, a estética do choque e do horror, mas da beleza aí presente, na desolação, no escuro, como nas paisagens abandonadas, fábricas, celeiros ou estações de comboios, espaços sem função prática, que não contam para nós no dia-a-dia, lugares deixados para trás, presos na sua condição objectiva sem uma temporalidade humana:
Uma parte de «INLAND EMPIRE» passa-se na Polónia. Porquê a Polónia? Por causa da estranheza da língua?
Não. Fui à Polónia, a Lodz, durante um festival de cinema e fiquei fascinado pelo aspecto da cidade, em pleno Inverno. É uma antiga cidade industrial, com muitas fábricas desactivadas - lindíssimas, pelo menos para mim. Uma luz espantosa, espessa, cinzenta e uma belíssima arquitectura. Apeteceu-me filmar ali.
Há quem ache que são espaços abandonados, feiíssimos... Dá-se conta que os seus valores estéticos são diferentes dos da maioria das pessoas?
Provavelmente, sim. Claro que gosto de flores e de árvores.
Embora não estejam muito presentes nos seus filmes.
Bem, há algumas árvores e flores, de passagem... Mas prefiro as coisas que me intrigam. O desconhecido é um mistério. Cada canto escuro alberga um mistério.
[Susana Viegas]
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